As muitas surpresas na economia em 2023 foram, na maioria, positivas. Basicamente, os indicadores que balizam a atividade melhoraram: crescimento do PIB, inflação, juro e dólar terminaram o ano passado acima do previsto.
Como teria sido se a tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro tivesse dado certo? Que mensagem seria enviada ao mundo e aos agentes econômicos locais um dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) enforcado na Praça dos Três Poderes, como revelou Alexandre de Moraes em arrepiante entrevista ao jornal O Globo (leia aqui)?
É claro que as perguntas são retóricas, porque as respostas são óbvias. Um país emergente que é vítima de um golpe de Estado vira pária global - como queria um ex-ministro das Relações Exteriores. Economia de mercado só convive bem com ditadura no poder na China, embora até lá já comece a dar sinais de desconforto, em parte traduzido em crescimento mais baixo.
Na medida em que vão se conhecendo detalhes não revelados antes, fica mais claro o risco real para a democracia fermentado em acampamentos em frente a quartéis e desbordado no chamado para a "festa da Selma". O mais assustador é o volume da irracionalidade a que chegou a mobilização, ao destruir parte da Praça dos Três Poderes e chegar a cogitar do ato extremo contra um ministro do STF.
Moraes não é um ser humano infalível que não pode ser criticado. Mas o que muitos que se consideram racionais ainda parecem ter dificuldade de entender é a diferença entre a crítica e a agressão, seja em forma de violência retórica ou qualquer outra, como a que provocou prejuízo multimilionário ao patrimônio público sustentado com dinheiro dos contribuintes. Ou a que delirou com um enforcamento em praça pública. Democracia é o espaço em que a direita critica a esquerda, vice-versa, e todas as nuances políticas exercem o saudável e necessário exercício de tecer opiniões sobre os outros, inclusive entre os poderes.
Nos depoimentos detalhados que começam a surgir agora - quando se imagina que o risco de insurreição esteja contido - foi por um detalhe: a não decretação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) pode ter feito a diferença entre um país que teve sobressaltos e surpresas positivas na economia em 2023 e o que se originaria de um golpe de Estado.
Nesse país imaginário, o presidente não viajaria, porque ditadores não costumam ser bem-recebidos no Exterior. Nem os empresários, em busca de negócios. Também não haveria melhora na nota de crédito, que ainda está longe da ambição de voltar ao "clube dos bons pagadores", mas depois de 2023, menos longe.
O saldo da balança comercial não teria ficado perto de US$ 100 bilhões (US$ 98,84 bilhões, conforme atualizado nesta sexta-feira), porque o comércio teria constrangimentos, se não sanções. E se alguém chamasse o presidente de turno de "ladrão" iria para a cadeia. Simples assim.