Quando a coluna afirmou que o horror de Blumenau aumentaria a pressão por regulação das redes sociais, observou que não se tratava de desejo ou projeção, mas constatação. Foi o que aconteceu, com a igualmente previsível reação.
Para entender o tamanho da briga que estão comprando, é preciso compreender os mecanismos que transformaram essas plataformas em gigantes com valor de mercado só comparável a PIBs de países e permitem sua sustentação nesse patamar.
Em uma formulação simplificada, o discurso de ódio alimenta o lucro de gigantes como Google, Facebook e Twitter. Essa não é uma opinião da coluna, mas constatação de estudo do celebrado Massachusetts Institute of Technology (MIT) divulgado ainda em 2018 (veja as conclusões clicando aqui).
Para facilitar, a principal constatação é de que uma informação falsa tem em média 70% mais de probabilidade de ser compartilhada (portanto, de gerar engajamento) do que uma notícia verdadeira. Conforme os pesquisadores, a verdade consome seis vezes mais tempo do que uma fake news nas redes sociais para atingir meras 1,5 mil pessoas.
Um dos motivos seria a percepção de que mentiras têm mais "originalidade" do que verdades - bem, isso é indiscutível -, muitas vezes vistas há muito tempo (como as tentativas de fazer reforma tributária no Brasil). Mas outra constatação é que a raiva e os discursos de ódio engajam mais do que vídeo de gatinho. Em vez de contemplação silenciosa e divertida, despertam mais reações, de compartilhamentos a novas postagens.
Dois ex-funcionários da rede criada por Mark Zuckerberg fizeram declarações públicas - a mais recente foi a de Frances Haugen, em 2021 (clique aqui para ler) sobre como os algoritmos alimentam conteúdos violentos para gerar mais engajamento. Em 2021, a etnia rohingya processou o Facebook por não ter adotado qualquer medida restritiva ao discurso de ódio que provocou sucessivas mortes em Mianmar (clique aqui para saber mais).
Obviamente, qualquer tentativa de regulação afeta o modelo de negócio das redes sociais. Mas quando as big techs tiveram de se submeter à regulação da União Europeia, no ano passado, era previsível que tentassem aplicar um modelo de contenção de danos. É o que tentam fazer agora no Brasil, com um projeto de lei que, embora esteja longe da perfeição, avança em um caminho já aberto.
Como jornalista, se a responsável por essa coluna acusar falsamente alguém de um crime, tem pena prevista em lei. Pelo artigo 138 do código penal, a calúnia pode levar a detenção de seis meses a dois anos. Nas redes sociais, é possível aprender como montar uma bomba ou compartilhar "feitos" como o assassinato de inocentes - sem consequências.
Então, não se trata de impor às big techs controles que não são aplicados a quaisquer outras atividades. especialmente as que envolvem serviços públicos essenciais, como transportes, água e luz. O mais curioso é que as redes socias desenvolveram complexos mecanismos para evitar, por exemplo, a exposição de nudez. E adotaram a restrição sem alegar que isso pode "piorar a sua internet". Se é certo que os políticos não podem ter liberdade para mentir, é mais certo que nem castas nem prestadores de serviços contem com essa possibilidade impunemente.