Há 15 dias, a coluna observou que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, exagerava no otimismo que faz parte da descrição do cargo ao mencionar a solução do marco fiscal: cobrar imposto de quem não paga.
Nesta terça-feira (18), Haddad enfrentou uma derrota inesperada exatamente nessa área: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva o obrigou a recuar na decisão de eliminar a isenção de até US$ 50 nas transações internacionais para pessoas físicas, por sugestão da primeira-dama, Janja Lula da Silva.
Na segunda-feira (17) à noite, ao sair do ministério, Haddad trazia no rosto o desgaste com o recuo, que anunciou só no dia seguinte. Não é apenas um golpe na imagem - um episódio como esse fragiliza qualquer ministro -, mas acende um sinal amarelo para a própria existência do marco fiscal. Ele já havia adiantado que precisa de R$ 100 bilhões a R$ 150 bilhões de arrecadação extra para que o arcabouço pare de pé - e repetiu nesta terça, ao falar em "acabar com a sangria" de ao menos 25% dos R$ 600 bilhões em renúncias fiscais.
Se não foi possível fechar uma brecha tributária que permite uma operação francamente irregular, é fácil imaginar o tamanho da resistência que haverá nos demais casos. Para lembrar, a isenção deveria valer apenas para transações de até US$ 50 entre CPFs, mas é usada para maquiar negócios de empresas.
Depois do marco fiscal, o que precisa ir ao Congresso é o que Haddad chama de "jabutis tributários". Trata-se de um conjunto de regras aprovadas na carona de outros projetos que criam facilidades, imunidades, incentivos e outras quinquilharias para segmentos, atividades e produtos específicos. O ministro quer, corretamente, eliminar esses "tratamentos diferenciados" que criam ainda mais distorções em um sistema tributário já disfuncional. Não vai ser apenas difícil, vai ser uma pedreira.
Embora o texto do marco tenha sido bem recebido por especialistas em contas públicas, a longa lista de 13 exceções confirmada pelo texto deixou o mercado inseguro: o dólar ensaiou voltar ao patamar de R$ 5 e a bolsa marcou passo (+0,14%). Entre as exceções ao limite de gastos estão transferências constitucionais a Estados e municípios, créditos extraordinários, despesas de universidades públicas federais, despesas com aumento de capital de empresas estatais não financeiras e não dependentes e despesas com acordos de precatórios a serem pagos com desconto.
O que Haddad ainda vai tentar
1. Fim da isenção de Contribuição sobre Lucro Líquido (CSLL) das despesas de custeio das empresas. Essa possibilidade surgiu de um "puxadinho legal", que era a retirada da cobrança do tributo sobre investimentos. Para Haddad, essa isenção faz sentido, mas a extensão às despesas de custeio, não. Faz sentido. Isso renderia, nas contas do ministro, arrecadação extra entre R$ R$ 80 bilhões a R$ 90 bilhões. Será um dinheiro que não era custo e passará a ser. Então, ou haverá forte resistência, com questionamentos à Justiça, ou vai parar nos preços, pressionado a inflação.
2. Outra fonte de receite seria a tributação dos sites de apostas esportivas. Nesse caso, não há protesto possível: é uma nova atividade, proibida no Brasil até pouco tempo atrás mas agora não está apenas estabelecida, mas disseminada. Por que não pagaria imposto? Até por envolver um possível "imposto do pecado" - afinal, envolve risco -, pode ter alíquota alta. Nesse caso, a conta do ministro é de entre R$ 12 bilhões e R$ 15 bilhões.