Sim, nós já ouvimos essa história antes. O ex-ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a aportuguesar a expressão corrente no tributarês (o peculiar idioma do segmento) internacional, sin tax, para "imposto do pecado".
E, de fato, o tributo vem aí, já rebatizado de forma mais neutra: imposto seletivo. Está lá - com o "cashback do povo" -, na primeira apresentação do secretário especial da reforma tributária, Bernard Appy, ao grupo de trabalho da reforma na Câmara dos Deputados.
Havia sido "apresentado" aos brasileiros por Guedes exatamente pelo mesmo motivo que integra a reforma tributária que o atual governo quer aprovar: está previsto nas duas propostas de emenda constitucional (PECs) que tramitam no Congresso, a 45, na Câmara, e a 110, no Senado.
Agora, sua definição parece mais restrita, portanto mais defensável: seria aplicado para desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao ambiente. Claro, ainda vai render muita polêmica, porque se o enunciado for levado ao pé da letra, os combustíveis fósseis (gasolina e diesel) seriam potenciais alvos dessa tributação, o que é bastante improvável política e economicamente.
A mesma lógica poderia incluir, entre os produtos tributados com o "imposto do pecado" (ou seletivo), automóveis com motores a combustão. Não dá nem para invocar o usual interdito a novos impostos: na prática, como a coluna já registrou, esse mecanismo já é aplicado no Brasil. Não é por outro motivo que a carga tributária da cachaça é de 81,9%, a do cigarro chega a 80,4% e a do uísque, a 61,2%, conforme levantamento do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).
Esse será um dos muitos pontos da reforma tributária que vai exigir discussões exaustivas sobre o que é de fato alvo potencial do imposto seletivo. A atual "dosimetria" de alíquota inclui nesse guarda-chuva produtos supérfluos em geral e de luxo em particular. Perfumes, por exemplo, são tributados em 78,99% (importados) e 69,13% (nacionais).
Sem o peso do apelido adotado por Guedes, o futuro imposto seletivo poderá taxar, por exemplo, iates e jatinhos que até hoje seguem isentos de IPVA. O Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional) estima anual de R$ 4,6 bilhões vindo de 1.681 helicópteros, 641 aviões e jatos, aviões turboélices e 131.544 embarcações.
As 20 bases da reforma, segundo Appy
1. Substituição de PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS por um ou dois impostos sobre valor adicionado e um seletivo
2. Base ampla de incidência
3. Não cumulatividade plena
4. Princípio do destino
5. Desoneração das exportações
6. Cashback do IVA
7. Legislação nacionalmente uniforme e o mais homogênea possível
8. Incidência “por fora”
9. Desoneração das exportações
10. Desoneração dos investimentos
11. Incidência sobre importações
12. Sistema operacional extremamente simples
13. Autonomia da União, dos Estados e Municípios
14. Fundo de Desenvolvimento Regional
15. Manutenção do Simples nacional
16. Manutenção da Zona Franca de Manaus
17. Transição segura para a sociedade
18. Garantia de ressarcimento dos saldos credores dos tributos atuais
19. Manutenção da carga tributária global
20. Transição mais longa para Estados e municípios