A reação negativa do mercado financeiro a declarações do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, não difere muito das que já ocorreram quando o atual ocupante do cargo, Jair Bolsonaro, patrocinou episódios de falta de compromisso com o equilíbrio das contas e a estabilidade institucional.
Mas por estar voltando, por ter antecedentes positivos - ainda que ambíguos - e, especialmente, porque vai precisar de instrumentos do mercado financeiro, não convém ao presidente eleito criar climão com investidores e especuladores.
Ao perguntar "por que as pessoas são obrigadas a sofrer por conta de garantir a tal da responsabilidade fiscal deste país?", Lula cometeu injustiça com apoiadores. Tanto os dois economistas não petistas que estão na equipe de transição - André Lara Resende e Pérsio Arida - quanto Armínio Fraga, que relevou anos de críticas petistas para se colocar ao lado da democracia, aprofundaram seu radar social nos últimos anos. O combate à tremenda desigualdade do Brasil está na agenda dos três.
Pode não ser o caso de boa parte do mercado mais focada em obter ganhos de curto prazo. Mas até a especuladores interessa ter um país com menor desequilíbrio. O motivo é simples: em uma economia mais uniforme, há menos solavancos, portanto menos riscos.
Existem motivos muito pragmáticos para evitar briga com o mercado. Lula quer abrir espaço no orçamento para os mais pobres. É justo. Isso significa que terá mais despesas do que receitas - espera-se que por curto período. Quando um governo gasta mais do que arrecada, precisa emitir títulos para obter os recursos e bancar a diferença, já que o Planalto ainda não fabrica dinheiro. Quem compra? Investidores e especuladores (mais os primeiros do que os segundos, já que são papéis de longo prazo). Quando maior a incerteza fiscal, maior será a remuneração que vão exigir, na forma de juro.
Não bastasse a necessidade de colocar dívida no mercado, Lula já deveria ter aprendido a resposta a suas perguntas nos seus dois mandatos e, se não, no mandato e meio de sua sucessora, Dilma Rousseff. Quando o mercado "fica nervoso", não perde dinheiro. Há mecanismos que permitem ganhos mesmo em ambiente muito desfavorável. Quem perde, por não ter acesso a mais ou menos sofisticadas ferramentas financeiras, são as famílias de renda mais baixa.
Ao mencionar a volta da fome ao Brasil, no mesmo discurso em que pareceu menosprezar a responsabilidade fiscal, Lula chorou. Disse que nunca imaginou que isso pudesse acontecer. Se o dólar sobe, gera inflação. Se a inflação permanece alta, é preciso elevar o juro. Tudo isso retira poder de compra do extrato social que o presidente eleito quer, corretamente, incluir no orçamento. Precisa ter foco e sabedoria para evitar o tristemente famoso "dar com uma mão e tirar com a outra".
Nesta sexta-feira (11), o dólar começou o dia com baixa de 2%, para R$ 5,288, e a bolsa ensaia uma reação subindo 1%. Ainda há tempo de conciliar responsabilidades fiscal e social, inclusive porque uma não existe sem a outra.