Depois de se reunir com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PDS-MG), o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, bateu o martelo: a "licença para gastar" deve ser mesmo definida por meio de uma proposta de emenda à Constituição (PEC).
Havia sido a posição inicial da equipe de transição coordenada pelo vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, depois questionada por outros aliados, como Renan Calheiros (MDB-AL), que apontaram risco de dependência de Lira para a tarefa.
Assim como o encaminhamento está definido, o valor do chamado waiver fiscal começa a se consolidar no patamar de R$ 175 bilhões. Fica perto, mas não muito, da quantia considerada aceitável por quem conhece os detalhes dos riscos orçamentários de 2023, de R$ 150 bilhões.
O problema, agora, é detalhar esses R$ 175 bilhões. A grande urgência da "licença para gastar", que seria necessária com Lula ou na hipótese de reeleição de Jair Bolsonaro, é garantir a manutenção do benefício de R$ 600 para o Bolsa Família (o nome vai voltar com seu criador).
Nas versões que circulam fora da equipe de transição, há duas composições. Uma aponta que todo o valor destinado ao programa social ficaria fora do teto, mesmo a parte já prevista no orçamento que permitiria pagar R$ 405, de R$ 105 bilhões, mais R$ 52 bilhões para completar os R$ 600 e ainda R$ 18 bilhões para o extra de R$ 150 prometido por Lula na campanha para cada criança de até seis anos. Nesse caso, seria aberto espaço sob o teto para gastos extras de R$ 105 bilhões para as demais pretensões do novo governo.
Outra formulação mantém dentro do teto o que já está previsto e abre espaços ainda não delimitados para recomposição de verbas para merenda escolar e Farmácia Popular, que quase desapareceram na previsão do orçamento de 2023, além de recursos para obras que, como disse Lula na noite de quarta-feira (9), não seriam "gastos", mas "investimentos". Na lei do teto, "gasto" significa apenas tudo o que não é receita ou renúncia, ou seja, a diferença é apenas semântica.
Exatamente por isso, outras promessas de campanha, como a correção da tabela do Imposto de Renda, não precisam de "licença" para descumprir o teto porque não representam gastos, mas redução de receita, como disse à coluna Bráulio Borges, pesquisador associado de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) que calcula o total de potenciais rombos no orçamento de 2023 em R$ 435 bilhões.