Desta vez, não é um boato nem surgiu em redes sociais sem liderança identificada: a ameaça de greve dos caminhoneiros foi comunicada oficialmente.
A mensagem no bilhete é: se não for pago o resgate – sob a forma de mudança na política de preços dos combustíveis e reajuste na tabela de frete –, o Brasil será paralisado, em meio a uma de suas crises econômicas mais sérias, com a inflação de volta aos dois dígitos, como era antes do Plano Real.
No sábado (16), durante um encontro de caminhoneiros autônomos e celetistas realizado em um hotel no Rio de Janeiro, foi declarado "estado de greve" imediato. Caso o governo não atenda às reivindicações em 15 dias, a categoria ameaça paralisar atividades, de fato, a partir de 1º de novembro.
Diferentemente de maio de 2018, quando não havia líderes identificados no movimento que teve o apoio do então candidato à Presidência Jair Bolsonaro, desta vez há organização clara e declarada: o encontro foi organizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes e Logística pelo Conselho Nacional do Transporte Rodoviário de Cargas e pela Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores. Ou seja, há com quem conversar e, caso necessário, a quem responsabilizar.
A Frente Parlamentar Mista dos Caminhoneiros Autônomos e Celetistas se apresentou para "fazer a interlocução com governo". Pelo tom, vai levar o bilhete do sequestrador com o pedido de resgate: a categoria fez o Brasil de refém. Presidente da Frente, o deputado federal Nereu Crispim (PSL-RS), diz saber dos "grandes transtornos que uma paralisação causa ao país", mas argumenta que "nenhuma das reivindicações acordadas" para encerrar a greve de 2018 foi atendida.
Não é preciso muito esforço de memória. Para encerrar a greve que fez a inflação saltar e a atividade econômica despencar, em maio de 2018, o governo Temer criou a tabela de frete – que agora a categoria quer ver reajustada – e concedeu subsídio público ao diesel, para ficar apenas em duas medidas tão pontuais quanto polêmicas.
Na época, não se sabia o tamanho do impacto econômico de uma paralisação da categoria. Agora, há consciência do risco. Depois da ameaça golpista de 7 de Setembro, Bolsonaro chegou a provar do próprio veneno e perder o controle de sua esquadra rodoviária. Foi temporário, mas já provocou atrasos em entregas. Embora os reajustes dos combustíveis sejam, de fato, insuportáveis, o caminho não é transformar o país em refém e cobrar resgate. Não há negociação sob ameaça.
A política da Petrobras
Para reajustar o preço nas refinarias, a Petrobras adota um cálculo chamado Paridade de Preços de Importação, adotado em 2016, no governo Temer. A intenção é evitar que a estatal acumule prejuízo com por não repassar aumentos de produtos que compra do Exterior, tanto petróleo cru quanto derivados, como a gasolina. A fórmula inclui quatro elementos: variação internacional do barril do petróleo — com base no tipo brent, que tem preço definido na bolsa de Londres —, cotação do dólar em reais, custos de transporte e uma margem definida pela companhia, que funciona como um seguro contra perdas.