Quando o IPCA de agosto bateu em 0,87%, analistas passaram a projetar que a inflação oficial do país poderia voltar a dois dígitos no dado anualizado. No mês passado, cinco capitais, inclusive Porto Alegre, já tinham alcançado esse patamar.
Agora, veio a alta assustadora de 1,16% em setembro, o maior para um setembro desde o Plano Real, há 27 anos, e a média nacional ganhou, mais cedo do que se temia, o duplo dígito no acumulado em 12 meses: 10,25%.
Como Porto Alegre já tinha inflação em dois dígitos no mês passado, segue bastante acima da média nacional, com IPCA acumulado de 11,35% de outubro de 2020 a setembro deste ano. Mas ainda é um patamar inferior a outras três capitais: Curitiba (PR), com 13,01%, Rio Branco (AC), com 12,37%, e Vitória, com 11,25%.
André Braz, coordenador dos índices de preços da Fundação Getulio Vargas (FGV), que quase cravou a projeção do resultado para setembro (no mês passado, estimou que seria de 1,02%), tentou tranquilizar os temores da coluna sobre o risco de perda de controle inflacionário:
— Nem tudo está perdido.
Não é uma frase assim muito alentadora, até porque Braz prevê que a inflação continue subindo nos próximos meses:
— O viés agora da inflação é de alta, mas não por demanda superaquecida. Vem de uma pressão de custos piorada pela crise hídrica. Nesses 10,25%, tem muita pressão de energéticos, seja de conta de luz com bandeira de escassez, seja de gasolina e gás de cozinha com pressão do petróleo e dólar. Quando junta todos os os itens energéticos, a alta representa mais de 50% do acumulado do IPCA.
O que inquieta especialistas como Braz é o que chamam de "espalhamento" da inflação. Em setembro, o "bandeiraço", ou seja, o reajuste de 49,63% na cobrança extra nas contas de luz, foi o maior vilão. Mas o coordenador da FVG diz que o aumento aparece nos alimentos, nos bens duráveis, nos serviços, nos carros — tanto novos quanto usados — nas passagens aéreas.
— Nem tudo perdido, mas o viés é de alta. Os produtos básicos vão continuar subindo e fazendo com que as famílias percebam na pele a perda de poder aquisitivo, na medida em que a inflação corrói o salário — lamenta Braz.