A deterioração das expectativas sobre o Brasil afetou o ministro da Economia, Paulo Guedes. Depois de afirmar que inflação de 7% a 8% ao ano está "dentro do jogo" — sendo que ele fez a regra que limitou a variação aceitável a 5,25% —, saiu-se com essa:
Eu conto ou vocês contam? Os problemas começam com o fato de que a renda média nacional é muitas vezes menor do que a do ministro. Para a maioria dos brasileiros, pagar a conta de luz cada vez mais cara significa abrir mão de qualidade na alimentação — quando não da quantidade.
Os reflexos negativos seguem para o impacto da conta de luz nos custos das empresas. Em um período já marcado por pressão da alta de preço de insumos e matérias-primas e dificuldade de elevar preços para o consumidor porque a renda média segue baixa, indústria e comércio têm uma nova dor-de-cabeça para administrar. Ou aceitam reduzir suas margens, muitas vezes já apertadas, ou repassam e correm risco de perder mercado.
Esse fluxo desemboca na inflação. Como o Brasil ainda é um país muito indexado, como Guedes sabe bem, por isso insiste em "desindexar" o orçamento, o IPCA fica mais pesado com a alta na tarifa de energia e provoca reajustes em cascata ao longo da cadeia produtiva. O IPCA ou seu "irmão", o INPC, corrigem valores de salários, contratos, financiamento imobiliário e até, de forma parcial, outra tarifas públicas.
A alta da inflação, por sua vez, provoca a necessidade de elevar o juro básico. O que é remédio para domar a alta de preços, no entanto, é veneno para a atividade produtiva, porque taxas altas inibem financiamentos e investimentos.
Guedes e, por extensão, o presidente da República são os únicos culpados pelo aumento de preços da energia, dos combustíveis à conta de luz? Não. Mas, no caso de gasolina, diesel e gás, Jair Bolsonaro contribui ativamente ao fazer bravatas golpistas que agravam a desvalorização do real frente ao dólar. No caso da eletricidade, faltou ao atual governo atuação mais proativa no estímulo à expansão da geração de energia. E agora, falta transparência e agilidade para lidar não só com o aumento de preço, mas com o risco crescente de racionamento generalizado — no setor público federal, já chegou.
A pergunta do ministro legitima outra, igualmente sem noção: Guedes ignora como a economia funciona?