Sempre que se menciona o grande crescimento econômico do Brasil no final da primeira década dos anos 2000, economistas têm na ponta da língua a origem da expansão do PIB no período: o "boom das commodities". Entre o final de 2020 e o início de 2021, esse ciclo está se repetindo, ainda mais forte.
Em bom português, referem-se a um ciclo de alta forte e duradoura de preços de matérias-primas básicas. Essas fases beneficiam países que vendem produtos como petróleo, minério de ferro e soja, como o Brasil, porque os valores dos itens de exportação ficam bem mais altos do que os de importação.
Em economês, isso é chamado de "termos de troca". Como os brasileiros vêm sentindo desde o ano passado, os produtos que o Brasil vende estão valorizados, tanto que o deslocamento de estoques para exportação é um dos fatores para a pressão de preços que vem pressionando a inflação.
Conforme dados da área de macroeconomia do Banco Central, no mês passado esses "termos de troca" ficaram 10,7% acima dos de fevereiro de 2011, considerado o ápice do "boom de commodities". O recorde absoluto de crescimento do PIB ocorreu, não por acaso, em 2010. Foram inesquecíveis 7,5% de disparada na atividade econômica. Conforme a maioria dos economistas, em boa parte resultado do superciclo das matérias-primas, que está de volta ainda mais forte.
Depois dos inéditos 7,5% de 2010, o PIB nacional avançou mais 3,9% no ano seguinte, apontado como auge do "boom das commodities". Em dois anos do governo Lula, o crescimento acumulado foi de 11,7%, desempenho literalmente excepcional, só comparável ao ritmo chinês. Foi logo depois que a revista The Economist fez a histórica capa em que via o Brasil decolando, depois contrastada com a frustração. A cotação nominal do dólar foi de R$ 1,7603 em 2010 e de R$ 1,675 em 2011. Esse é um dos benefícios dos "termos de troca" favoráveis: a valorização das moedas dos países exportadores de commodities.
E agora, o Brasil vai repetir o desempenho da virada da década anterior? Um estudo da área de macroeconomia do Itaú Unibanco ajuda a responder: constata que houve "descolamento" entre preços de commodities e apreciação de moedas de países exportadores desses produtos na pandemia, especialmente para real, peso chileno e rand sul-africano. Esse comportamento é atribuído a "restrições temporárias de oferta e à evolução da pandemia/vacinação e seus impactos sobre a perspectiva de recuperação e fundamento fiscal de cada país". E aprofunda, no caso do real:
"O risco fiscal permanece elevado, mas o aumento da taxa Selic, bem como a perspectiva de recorde de exportações (favorecida pelos preços elevados de commodities), deve dar alguma sustentação para a moeda adiante. Ainda que insuficiente para eliminar o descolamento em relação aos preços globais de commodities, tal alta deve ajudar a evitar uma trajetória de forte depreciação, como a observada no último ano."
Então, a resposta resumida para a pergunta do título é: o atraso na vacinação e sinais de pouca responsabilidade fiscal, como o orçamento sem credibilidade, vão travar a carona do Brasil no "boom das commodities" na nova virada de década. Mas ao menos os "termos de troca" vão acalmar o câmbio.