O jornalista Leonardo Vieceli colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço.
O avanço do índice oficial de inflação em 2020, para 4,52%, reflete uma sucessão de fatores que deixou mais salgado o valor de alimentos na pandemia. A taxa verificada no ano passado é a maior para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) desde 2016. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentou os dados nesta terça-feira (12).
Especialista em preços da Fundação Getulio Vargas (FGV), o economista André Braz frisa que a alta não indica descontrole inflacionário, já que está bastante relacionada a alimentos. Por outro lado, considera que o impacto alimentício "não é confortável", porque penaliza as camadas desfavorecidas da população. Proporcionalmente, as pessoas mais pobres tendem a comprometer parcela mais elevada do orçamento para conseguir comprar produtos básicos.
— Do ponto de vista social, o aumento nos preços de alimentos é muito ruim — sublinha Braz.
Em 2020, o grupo alimentação e bebidas disparou 14,09%. Trata-se da maior variação desde 2002 (19,47%). Para o economista da FGV, uma "tempestade perfeita" explica a disparada.
Esse conjunto de fatores inclui o aumento de preços de produtos básicos no mercado internacional, estimulado pela alta do dólar. Problemas na safra de alguns alimentos, como o arroz, também geraram pressão nas gôndolas dos supermercados.
Além disso, houve mudança no padrão de consumo durante a pandemia, já que a população passou a cozinhar mais em casa. Por fim, o auxílio emergencial serviu para esquentar a demanda.
Ao longo de 2021, a pressão dos preços deve incentivar o aumento no juro básico, atualmente na mínima histórica (2% ao ano). A primeira reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), neste ano, ocorre na próxima semana.
Economista-chefe da corretora Necton Investimentos, André Perfeito avalia que a pressão inflacionária sugere alta na Selic "em breve". Ou seja, no primeiro ou no segundo trimestre.
Braz adota tom mais cauteloso. Na visão dele, a Selic deve subir em 2021, mas não de maneira tão rápida. É que, segundo o especialista, aumentar a taxa de juro no momento em que a economia tenta reação poderia ser um "tiro no pé".
— Como está muito concentrada em alimentos, a inflação não gera tanta motivação para alta no juro agora. É a inflação generalizada que é perigosa. É isso que gera aumento no juro de forma mais rápida. Ainda é cedo para dizer quando vai ocorrer a alta na Selic — diz o especialista.