No acordo para fechar o maior negócio na área de ensino superior já feito no Brasil, havia previsão de que a multa de R$ 180 milhões devida pela Laureate à Ser Educacional poderia ser substituída pelo repasse de duas pequenas instituições de ensino.
Nesta quarta-feira (4), a Ser Educacional informou o mercado que prefere receber os R$ 180 milhões em dinheiro e reafirma seu interesse compra de UniRitter, Fadergs e Centro Universitário Hermínio da Silveira.
Conforme fato relevante da Ser, o grupo "exerceu seu direito de receber R$180 milhões em dinheiro (...) ao invés de receber neste momento, em dação em pagamento, o direito à propriedade futura de 100% das quotas das sociedades mantenedoras das Instituições Faculdade Internacional da Paraíba (FPB) e Centro Universitário dos Guararapes (Unifg)". Ambas pertencem à Laureate e ficam no Nordeste, onde a Ser Educacional já concentra negócios.
Um dos motivos para a decisão, segundo fontes do mercado, é a necessidade de reservar recursos para a compra das duas universidades gaúchas e da carioca. A avaliação é de que o valor desse negócio alcance R$ 1 bilhão. No mesmo documento em que comunica a decisão de receber sua multa em dinheiro, a Ser Educacional lembra que mantém "opções de compra sobre as sociedades mantenedoras do Centro Universitário Ritter dos Reis (UniRitter), do Centro Universitário Fadergs; e do Centro Universitário Hermínio da Silveira".
Com tantas mudanças ao longo do último mês, é bom manter cautela sobre o desfecho final desse negócio, até porque o prazo para a Ser Educacional confirmar essa compra vai até 14 de janeiro.
PARA ENTENDER
A disputa ocorreu entre gigantes do ensino privado, com ações negociadas na bolsa de valores. Por isso, toda a comunicação do processo é vigiada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que disciplina essas companhias. Os envolvidos evitam fazer comentários além dos fatos relevantes que são obrigados a publicar.
OS ENVOLVIDOS NA DISPUTA
Quem vendeu
A Laureate no Brasil tem cerca de 50 campi em 13 cidades de sete Estados e mais de 500 centros de ensino à distância. No primeiro trimestre deste ano, tinha 267 mil alunos, 82% dos quais na modalidade presencial e com mais de 800 em cursos de medicina. No Rio Grande do Sul, é dona da UniRitter e da Fadergs.
Quem vai comprar
1. Ser Educacional: vai ficar com UniRitter e Fadergs, além de uma instituição carioca. Foi criada em 1994, como curso preparatório a concursos, tem cerca de 50 instituições concentradas no Norte e no Nordeste, das quais a mais conhecida é a Uninassau. Tem 184,8 mil alunos e receita de R$ 1,75 bilhão. É controlada por Janguiê Diniz, ex-engraxate que foi procurador do Trabalho (leia aqui entrevista com o empresário).
2. Ânima: vai ficar com as demais instituições de ensino da Laureate no Brasil. Tem cerca de 115 mil estudantes matriculados em cursos presenciais em campi em Minas Gerais, São Paulo, Santa Catarina, Paraná, Goiás, Bahia e Sergipe. Uma de suas escolas mais conhecidas é a São Judas Tadeu, de São Paulo, sem relação com a instituição de ensino de Porto Alegre. É dona da HSM, de educação e eventos corporativos e tem parceria com a Singularity University, do Vale do Silício. Tem três sócios, entre os quais Daniel Castanho, líder do movimento #nãodemita (leia aqui entrevista com o empresário)
A LINHA DO TEMPO
Meados de julho: o grupo Ser Educacional publica fato relevante em que informa sobre a disposição de compra da Laureate no Brasil. Fontes do mercado apontam interesse também da Cruzeiro do Sul, que não tem ações negociadas na bolsa.
13 de setembro: em comunicado conjunto, em pleno domingo, Laureate e Ser Educacional informam ter fechado acordo de venda por R$ 4 bilhões, dos quais R$ 1,7 bilhão seriam pagos em dinheiro.
14 de setembro: como o acordo anunciado na véspera tem cláusula que permite à vendedora avaliar ofertas maiores, a Yduqs (ex-Estácio) anuncia que tem interesse em fazer uma "proposta melhor".
7 de outubro: uma semana antes do prazo final, dois grupos além da Ser Educacional apresentam propostas, a Yduqs e a Ânima. Como a Laureate tem forte presença em São Paulo, ambas aceitam se desfazer de parte dos negócios para evitar restrições por concentração de mercado.
21 de outubro: a Laureate afirma que a melhor oferta é a da Ânima, mas a Ser Educacional entra na Justiça e consegue uma liminar contra o fechamento do negócio com a concorrente.
27 de outubro: a Ânima comunica que a Laureate aceitou sua proposta de R$ 4,4 bilhões, dos quais R$ 3,8 bilhões em dinheiro, R$ 623 milhões em dívidas que vai assumir, e mais potenciais R$ 203 milhões relativos a vagas em cursos de Medicina pendentes de aprovação.
28 de outubro: a Ser Educacional informa que a liminar que havia obtido foi revogada, mas "a questão relativa ao válido exercício do direito de go-shop será discutida por meio de arbitragem" e que "se mantém certa de seus direitos e tomará todas as medidas cabíveis para garantir o efetivo cumprimento" do acordo.
30 de outubro: a Ser Educacional anuncia o fim de disputas jurídicas e arbitrais, e que terá direito de compra das duas universidades gaúchas, além de uma instituição carioca.
2 de novembro: a Ânima Educação comunica a assinatura do contrato de compra dos negócios da Laureate no Brasil.