No meio da tristeza e da raiva profundas que tomaram conta de muitos brasileiros, buscamos culpados neste governo, no anterior, em todos desde Juscelino Kubitschek, último presidente a colocar seus pés no Museu Nacional, destruído por um incêndio que começou no domingo. A tristeza provém do tamanho da perda, que ninguém ousa calcular mas é gigantesca. Não só dos itens expostos, mas de dois séculos de conhecimento acumulado, agora transformado em cinza. A raiva, da certeza de que se trata de uma tragédia não só anunciada, mas que tinha até plano para ser evitada. Só não deu tempo. Só não teve nossa atenção. Só não teve nossa presença.
A parte de baixo da foto acima está um pouco escura (perdão, leitores), mas permite ver o tamanho da fila em um dia de semana de julho no Museo de La Plata, congênere do Museu Nacional nessa cidade criada para ser a capital da província de Buenos Aires. Era terça-feira, dia 24 de julho. No período de férias escolares, pais esperavam pacientemente com seus filhos a vez de entrar na instituição que é parte da Faculdade de Ciências Naturais. É um museu universitário, ou seja, assim como o Nacional, tem como finalidade, além de preservar e expor coleções, permitir ensino e pesquisa. E atrai um grande público.
Criado em 1884, originou-se de doação de Francisco Pascasio Moreno, conhecido como Perito Moreno, que batiza a geleira mais conhecida da América do Sul. Moreno também foi seu primeiro diretor. Com a criação da Universidad Nacional de La Plata, foi incorporado. Tem coleções atrativas, mas como todo museu latino-americano destinado à pesquisa e conhecimento, uma modernização o beneficiaria. Isso não afasta o público, ao contrário. Está certo, na Argentina, a despeito de todas as crise, a cultura ainda está entre as prioridades dos cidadãos. Mas se está nas suas e nas minhas, não temos outra opção: temos de ocupar nossos museus. Com filas como as da foto na frente do Museu Nacional, presidentes, ministros e outras autoridades não ousariam ignorá-lo como o fizeram.