O recente livro do Fabrício Carpinejar, Cuide dos Pais Antes que Seja Tarde, nos traz os melhores argumentos para conviver bem com o impacto da longevidade atual. A mensagem é simples mas necessária: um tributo aos que nos antecedem e como agradecer por aquilo que nos deram. Promove a aliança entre as gerações, ensina a suavizar os encontros, a perdoar as fraquezas de parte a parte.
O melhor é a doce descrição do que o corpo faz conosco: envelhecer é subir escadas mesmo sem degraus. Porém, em toda obra, há um sentido prático: suportar o momento em que o filho se torna o pai de seu pai; quando vira o fio e precisamos cuidar deles, tendo a delicadeza de não infantilizá-los.
A mensagem imprescindível do livro serve para a maioria das famílias, mas não para todas. Se Deus está nos detalhes, o diabo está nas exceções. Vamos a elas: existem pessoas que não têm vocação para ter filhos. Quando isso lhes acontece, sentem-se traídas pelo destino e passam a odiá-los.
Talvez a frase mais agressiva que possa ser pronunciada seja: "Você não deveria ter nascido!". Imagine quando ela vem – dita ou subentendida – dos progenitores. Há uma legião de psiquicamente mutilados por ouvi-la, ou quando a mensagem dos pais tem esse mote como fundo. A maternidade e a paternidade nos fazem melhores, quando dão certo. Já quando dão errado, abre-se a porta do inferno.
Um erro não justifica outro. Se você não teve bons pais, nem por isso deverá ser um mau filho. Devolver apenas o que se ganhou é a matemática da mesquinhez. Terá como juros o ressentimento e a amargura. Carpinejar nos lembra isso claramente. A questão é que às vezes não há jeito. Certos laços, infelizmente, nasceram rompidos, é inútil a insistência em criá-los, em esperar algo de onde nunca veio nada. Isso é chafurdar na neurose.
A idade nos melhora? Sim, para a maioria. A sabedoria é lenta para se instalar. Não para as pessoas narcisistas, ignorantes de que o corpo é uma causa perdida. Essas envelhecem mal e pioram. O problema agregado é que todo filho costuma ser um devoto, incrédulo da indiferença dos pais. Tendem a pensar que, se não estão agradando, foi por falta de esforço ou por não serem dignos. Por isso, os mais rejeitados acabam sendo os mais abnegados, missionários da fé na conversão amorosa dos pais.
Para estes últimos, a libertação é abrir mão desse anseio, só para eles as indicações do livro do Carpinejar não servem. Para os filhos de pais tóxicos, sugiro que sigam adiante, olhando para trás somente o indispensável. Não descuidem da vida, nem de seus pais, mas abandonem a esperança de serem amados. É o único momento da vida quando desistir da esperança inaugura a liberdade. Para os outros, aproveitem a oportunidade do carinho em todas as conjugações do amor. Carpinejem a horta de seus antecessores.