Ricardo Tavarelli passou pelo Grêmio em 2004, em um dos piores momentos dos mais de 100 anos do clube. Mas não deixou de fixar-se na memória dos torcedores pelo seu estilo peculiar, tanto nos uniformes quanto na forma de jogar.
Aos 49 anos, o ex-goleiro mostra ainda hoje que é um sujeito particular. Nesta semana, na figura de um industrial, ele acaba de colocar em funcionamento em Ciudad del Este uma fábrica de máscaras de proteção.
Sairão da planta da Total Block 30 milhões de unidades mês. A linha de produção funcionará 24 horas por dia, e a ideia de Tavarelli e de seu sócio, o cunhado, centroavante e ídolo Roque Santa Cruz, é abastecer o mercado brasileiro. A marca também está exportando álcool gel. Por telefone, Tavarelli conversou com a coluna.
Como o ex-goleiro Tavarelli virou um industrial que produzirá milhões de máscaras por mês?
Essa ideia surgiu seis meses atrás. A empresa, a Total Block, faz parte de uma holding, a Flavors of America, cuja sede fica em Ciudad del Este, na fronteira com Foz do Iguaçu, e que se dedica muito a trabalhar com o Brasil. Exportamos muito. A Flavors fabrica narguilés e também representa a Zomo (marca mundial de tabaco). Também tem fábrica de papel. Seis meses atrás, tínhamos 28 escritórios de representação no mundo, em lugar como o Oriente Médio, Europa e EUA. Detínhamos a informação de que haveria escassez de máscaras em um futuro próximo. Nos preparamos. Não foi fácil, enfrentamos problemas de logística. Compramos tudo da China, que passou a reter máquinas e insumos. Como você está inserido numa indústria, precisa estar sempre adiantado. Conseguimos receber os equipamentos e os produtos e colocamos a fábrica para funcionar. Na verdade, ainda estamos em processo final de montagem. A capacidade de produção foi sempre pensando no mercado brasileiro.
A produção será de quantas máscaras? Tudo será destinado ao Brasil?
Ontem (segunda), por exemplo, nos ligou o Lúcio, ex-zagueiro. Ele jogou com o Roque Santa Cruz no Bayern e nos procurou interessado em ajudar pessoas no Brasil. A gente já contatou com alguns governadores daí. A prefeitura de Manaus nos procurou interessada em comprar nossas máscaras. O Brasil está levando a sério o projeto e será nosso maior cliente. O Paraguai é pequeno, tem 7 milhões de habitantes. Nosso plano, com a fábrica a pleno, é produzir 30 milhões de máscaras por mês.
Além da população menor, o Paraguai também conseguiu fazer um bom controle do coronavírus (até terça-feira, eram 786 casos e 11 mortes).
A política do governo aqui foi boa. O ministro da Saúde, Julio Mazzoleni, é um cara muito entendido da matéria, conta com excelente equipe de trabalho. Aqui, o presidente tem de fazer o que o ministro diz. O país fechou as fronteiras e a maioria dos casos são importados, de gente que veio do Exterior. O índice do vírus comunitário é baixo. É claro que a economia foi um pouco afetada, mas temos de esperar, a vida está antes de tudo.
Quer dizer que, em novembro, no Oriente Médio, vocês já ouviam falar da perspectiva de uma pandemia?
Foi lá por novembro, dezembro. Mas também já havia desabastecimento no Brasil. Fomos coletando dados, perguntávamos no Oriente Médio e em outros países sobre isso (perspectiva de falta de EPIs). A tendência já era de que careceríamos desses produtos. Uma linha de produção como a nossa não se faz de hoje para amanhã. A indústria não funciona assim, com essa dinâmica. Enfim, nossa ideia é, com a fábrica em Ciudad del Este, disputar mercado com os chineses. A logística é menor, o Paraguai tem baixa carga de impostos. Isso nos faz competitivos.
Que máscaras são essas que vocês produzem?
São de tripla camada, têm boa capacidade de proteção, inclusive com SMS (tecido usado para esterilização), descartáveis. Agora, estamos trazendo as máquinas para a produção de máscaras KN95 (versão mais sofisticada). A meta é fabricar 8 milhões por mês desse modelo.
Quantos empregos serão gerados na fronteira com essa linha de produção das máscaras?
A fábrica, agora, opera 24 horas por dia. São três turnos de trabalho. Nosso plano é logo chegar a cerca de 1,5 mil empregos diretos. Vale lembrar que a planta de saborizantes de tabaco da Flavors of America foi adaptada na quarentena e está produzindo álcool gel, com a marca Total Block. Começou com 5 mil litros por dia. Hoje, está com produção diária de 20 mil litros. A projeção, em 45 a 60 dias, é estar produzindo 50 mil litros por dia.
Como o ex-goleiro virou parte de um pool de empresários e enveredou para o mundo dos negócios?
Temos, eu e o Roque, outros negócios, além dessa participação na Total Block. Temos uma parceria em franquia da Royal Building System (sistema canadense de construção com PVC e concreto), a fabrica fica aí no Espírito Santo. Somos representantes aqui no Paraguai. Estamos construindo casas pré-fabricadas. Gosto de me envolver em projetos que nada têm a ver com futebol.
Você disse que o Roque Santa Cruz é seu cunhado. Quem casou com a irmã de quem?
Ele se casou com a minha irmã, esse bandido (risos). Éramos companheiros no Olimpia e, depois, na seleção paraguaia. Trabalhamos juntos, outra vez, no Olimpia, quando fui gerente executivo pela segunda vez, entre 2015 e 2016. Na primeira, entre 2010 e 2013, perdi a Libertadores para o Atlético-MG, de Ronaldinho.
Aliás, para encerrar, como você vê a situação de Ronaldinho, detido em um hotel de Assunção depois de passar um período preso?
Fomos visitá-lo na sexta-feira, eu e o Roque. Ronaldinho é muito gente boa, um pessoa de um carisma impressionante. Deu alegria a muita gente, nos encantou. Acho que ele toma algumas lições disso tudo. Mas é um cara que está sempre sorrindo, tem uma alegria característica, muito dele. Nota-se isso em instantes. Aqui, quando uma pessoa é assim, humilde e carismática, dizemos que tem um anjo nelas. Isso se aplica a Ronaldinho. Falamos um pouco também com Roberto (Assis), um cara espetacular, e com Sérgio Queiroz, o advogado que está com eles. Conversamos sobre futebol, sobre a vida, tratamos de um pouco de tudo.