Ainda vai demorar para o Inter receber de volta cada real extraído de sua conta na forma de notas falsas e propinas. Numa previsão pessimista, talvez nem seja na gestão do próximo presidente. Que é bom sempre lembrar, terá três anos. Tudo porque eventual pedido de ressarcimento poderá ter de esperar todo o processo penal. Aliás, antes disso, é preciso que o juiz aceite a denúncia apresentada pelo Ministério Público.
Partindo da ideia de que a denúncia seja aceita, há todos os procedimentos de um processo, como apresentação de defesa, produção de provas, testemunhas, perícias em documentos a serem pedidas pelos advogados dos acusados. Vencidas essas etapas, o juiz dá sua sentença.
Seguem-se os recursos, como embargos de declaração, em caso de alguma dúvida pelas partes, ou esclarecimentos. Só depois de esses serem julgados é que se parte para a apelação no Tribunal de Justiça, a segunda instância. O acórdão dos três desembargadores designados para o julgamento também pode ser alvo de embargos de declaração.
Publicado o acórdão, a próxima etapa para contestar a decisão será o Superior Tribunal de Justiça, em Brasília, caso ela tenha violado algum ponto do Código de Processo Penal. Por fim, caso os advogados sintam que a decisão tenha infringido algum artigo da Constituição, poderão apresentar um recurso extraordinário no STF.
Todo esse caminho jurídico consumirá um bocado de tempo. Mesmo assim, o presidente do Inter, Marcelo Medeiros, em reunião do Conselho de Gestão, na quarta-feira à noite, tratou da contratação de um escritório de advocacia para acompanhar, desde já, todo esse processo e buscar, ao final dele, o ressarcimento dos R$ 12,8 milhões tirados de forma irregular dos cofres colorados.
Histórico do caso
A maioria das notas fiscais apresentadas por Affatato para dar baixa nos valores que ele retirava em adiantamentos do Inter era da Keoma Construção, Incorporação e Planejamento. Esta empresa emitiu R$ 5,3 milhões em notas de serviços prestados, mas o sócio majoritário da empresa, Edson Joel Rodrigues, afirmou que a Keoma nunca trabalhou para o Inter.
Uma das notas da Keoma apresentadas por Affatato, ao custo de de R$ 635 mil, referia-se a supostos serviços no terreno do Centro de Treinamento de Guaíba, onde não havia obra até então. À época da emissão do documento fiscal, em 2015, o Inter sequer detinha autorização ambiental da Fepam para fazer intervenções no terreno.
O ex-vice-presidente de Finanças se valeu de outras três empresas, todas elas assessoradas contabilmente pelo contador Adão Silmar de Fraga Feijó, também denunciado, para apresentar notas que totalizaram R$ 9,9 milhões para justificar seus saques.
Affatato ainda usou uma empresa da sua família, a Rodoseg Segurança e Engenharia Rodoviária, para instalar guard-rails no complexo Gigante da Beira-Rio ao custo de R$ 1 milhão. Ele apresentou as notas da Rodoseg para dar baixa em adiantamentos sacados no caixa do clube.
Conforme a lei que estabeleceu o Programa de Modernização da Gestão de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut), é vedado aos clubes contratar empresas das quais façam parte os seus gestores ou familiares.
A suposta vinculação Ferreira, ex-vice-presidente de Administração, com as irregularidades também seria relacionada às notas fiscais de obras que não foram localizadas no Beira-Rio, mas que geraram custos aos cofres do clube.
Em cinco delas, Ferreira avalizou os pagamentos. O responsável por assinar a maioria das notas fiscais da Keoma e das outras empresas usadas para justificar adiantamentos teria sido o engenheiro civil Ricardo Bohrer Simões, também denunciado.
As apurações indicaram que Simões pode ter chegado ao Beira-Rio por intermédio de Ferreira: o engenheiro foi responsável técnico de duas empresas do ex-dirigente colorado, a Pavitec do Brasil Pavimentadora Técnica e a Paviway Pavimentação. Também foi denunciado pelo MP o engenheiro Carlos Eduardo Marques, que teria atestado falsamente a realização de obras fictícias descritas em notas fiscais.
Além da Keoma, Simões abriu a empresa Pier Serviços Eireli que, entre 2015 e 2016, teria recebido R$ 1,5 milhão do Inter por serviços não detectados nem mesmo por auditorias contratadas pelo próprio clube. Simões também foi procurador da Empresa Gaúcha de Estradas (Egel), beneficiada com R$ 194,3 mil do clube, e esteve associado informalmente à Keoma.
A Egel tinha endereço em Balneário Gaivotas, em Santa Catarina, em um trecho de rua de chão batido. O GDI esteve no local e, no logradouro indicado no CPNJ, existia uma casa de uma cabeleireira que nunca tinha ouvido falar da Egel.
Nomes dos denunciados
Vitorio Piffero, ex-presidente
Pedro Affatato, ex-vice de Finanças
Emídio Marques Ferreira, ex-vice de Patrimônio
Carlos Pellegrini, ex-vice de futebol
Carlos Eduardo Marques, engenheiro do clube
Ricardo Bohrer Simões, empresário
Adão Silmar de Fraga Feijó, contador
Paola Affatato, empresária e irmã de Pedro
Arturo Affatato, empresário e irmão de Pedro
Rogério Braun, empresário de futebol
Paulo Cézar Magalhães, tio do ex-lateral do Inter de mesmo nome
Giuliano Bertolucci, empresário de futebol
Fernando Otto, empresário de futebol
Carlos Alberto de Oliveira Fedato, empresário de futebol