Você, associado do seu clube do coração, poderá virar acionista. Seu time, em vez do E.C ou do F.C acoplado ao nome, pode ganhar a extensão SAF. Mais do que tudo isso, o futebol brasileiro poderá, talvez até o final do ano, ingressar numa era empresarial. O projeto de lei 5082/2016 tramita na Câmara dos Deputados e tem em seu cerne a permissão para que os clubes deixem de ser associações e virem empresas, com injeção de investimentos privados.
Antes de explicar o projeto em si, vale um recuo breve. A permissão para os clubes virarem empresas constava na Lei do Profut, aprovada em 2015. A então presidente Dilma Roussef, no entanto, vetou alguns artigos, entre eles esse novo modelo de gestão.
Em 2016, os deputados Domingos Sávio (PSDB-MG) e Otávio Leite (PSDB-RJ) elaboraram projeto para derrubada desses vetos. A ideia não avançou. Só que, em fevereiro deste ano, Sávio pediu o desarquivamento, e a Mesa da Câmara atendeu ao pedido.
Neste momento, a PL 5082/2016 aguarda pela criação da comissão em que será discutida antes de ir a plenário. As informações são de que o presidente da Câmara, o botafoguense Rodrigo Maia, é simpático ao projeto e pretende dar-lhe celeridade.
Caso aprovado, o PL 5082/2016 mudará os rumos do futebol brasileiro. Os clubes poderão virar empresas, com ações na bolsa e permissão para receber investimentos. Para isso, no entanto, terã de deixar de ser associações, modelo, por exemplo da dupla Gre-Nal, para virar SAF (sociedade anônima do futebol).
É bom deixar claro: a lei faculta aos clube decidir se seguem no modelo atual ou se ingressam no mundo empresarial.
O texto do PL 5082/2016 prevê vários modelos para essa transição.
O clube pode, em sua totalidade, passar a gestão para investidores. Ou pode, ele próprio, passar a ser uma S/A. Assim, deixaria de ser entidade sem fins lucrativos, passando a pagar impostos, e faria dos associados seus acionistas. Esses poderiam chamar investidores e fundos para participar. Evidentemente, tudo isso a partir do crivo do Conselho Deliberativo.
Um outro modelo permite transferir apenas a gestão do futebol, com o clube seguindo no comando de sua parte social e das outras modalidades esportivas. Esse, por exemplo, é o modelo do Bayern de Munique. Os bávaros mantiveram o clube social original, mas criaram o Bayern Futebol, que tem como um dos principais acionistas o clube social, ao lado de gigantes como a Audi e a Allianz.
O projeto prevê que SAF poderá lançar ações preferenciais e ordinárias, essas com direito a voto. As preferenciais nunca poderão ultrapassar os 50% do total. Para proteger os clubes, somente eles terão direito as ações ordinária de classe A. O que significa isso? Esses acionistas decidirão sobre temas centrais, como a venda de imóveis, mudança de cidade, trocas no nome, no uniforme e no escudo e até a fusão ou transmissão dos direitos para outra empresa.
A CBF criou grupo de discussão com dirigentes e especialistas na área para debater o projeto. Sócio de consultoria para esportes da Ernst & Young, Alexandre Rangel faz parte do grupo. Rangel prevê que a abertura do capital dos clubes poderá equalizar as forças. Hoje, Palmeiras e Flamengo descolaram dos demais. A exceção seria o Grêmio, cuja gestão equilibrada recuperou-o e o capacitou a investir.
— Existem várias opções de investidores querendo aplicar seus recursos nos clubes. Dinheiro no mundo não é problema. O que falta é esse marco jurídico e tributário para que possam colocá-lo aqui — explica Rangel.
O projeto prevê, em seu artigo 48, requisitos para ser acionista nas SAFs. A pessoa física deve ser brasileira e residente no país. Em relação às empresas ou fundos, devem seguir as leis brasileiras e ter sede no território nacional. Ou seja, se os xeques catarianos donos do Manchester City quiserem espichar os olhos para cá, poderão.
Hoje, 18 dos maiores clubes da Europa são administrados como empresas, com ações na bolsa e investidores injetando recursos. As exceções são o Barcelona e o Real Madrid, que seguem o modelo associativo.
— Esses investidores têm dezenas de bilhões de euros. Vir ao Brasil e aplicar 100 milhões de euros, para eles, não é nada. Aqui, é um valor importante, para sanear os clubes — diz Rangel.
Por enquanto, todo esse cenário é apenas um projeto. Mas, prepare-se. De associado, você pode virar acionista.