Eu sei que estamos todos sedentos por uma aglomeração. Que até mesmo o mais caseiro dos seres não vê a hora de tirar o pijama e enfeitar-se para celebrar com os amigos a volta à normalidade. Já passa de dois meses o período em que estamos em casa respeitando, na medida do possível, as regras de distanciamento social a fim de tentar conter a pandemia do novo coronavírus. Ou ao menos para dar tempo às autoridades para construção de novos leitos hospitalares que possam fazer frente à demanda aumentada pelos casos de covid-19. Eu sei e você também sabe disso. Mas ainda assim, não é hora de fazer festa em restaurante.
Digo isso porque acompanhei atentamente a construção do protocolo entregue à prefeitura pelos representantes de bares e restaurantes, sob o comando do presidente do Sindha, Henry Chmelnistky . Um estudo minucioso, detalhado e que carregava ali também o sonho de muitos pequenos empreendedores que àquela altura (alguns até hoje) conviviam com o medo de que seus empreendimentos talvez tivessem que fechar as portas para sempre. Minha amiga Cristina e eu choramos juntas quando, por telefone, ela me contou que não teria mais condições de continuar. Com as portas de seu bistrô fechadas devido à pandemia e uma preocupação responsável com a vida das pessoas, ela percebeu que seria inviável manter a estrutura por mais tempo sem acumular prejuízos - aluguel, impostos, gastos mensais. E assim decidiu encerrar aquele que, para mim, era o local onde se fazia o melhor pastel do mundo.
Acompanhei a apreensão dos amigos da Flor e Cultura aqui no bairro Petrópolis, onde moro, lugar cheio de amor e significado onde gostamos de sentar aos sábados de manhã para ler um livro e tomar suco fresquinho, feito na hora. E a dor de outro amigo querido, o Chico, do Barranco, que também admitiu a tristeza ao pensar que talvez tivesse que encerrar as atividades de um dos restaurantes mais tradicionais da cidade. E chegou a recrutar seus garçons - entre eles outro amigo, o Marcelinho -, para que fossem também entregadores dos pedidos, a fim de que ninguém perdesse seu emprego nesses tempos difíceis.
Conto isso para dividir com vocês a angústia de perceber que a reabertura dos restaurantes, a partir de decreto da prefeitura de Porto Alegre, expôs cenas tristes de pessoas que ainda não foram capazes de compreender que cabe a cada um de nós evitar a propagação desse vírus medonho. Os bares estão abertos, sim, e é para que usemos e desfrutemos. Mas nunca sem esquecer da nossa responsabilidade. É bonito e saudável ver que juntos construímos caminhos para voltar à rotina. Mas não dá para admitir desrespeito aos modelos de segurança. Lave as mãos, use álcool em gel, não promova aglomerações.
Se cada um de nós não se der conta disso, os bares voltarão a fechar, o vírus se propagará mais facilmente. Pense nos sonhos que ficarão para trás. Pense nas pessoas.
Somente no Brasil, o novo coronavírus já provocou mais de 20 mil mortes. Vinte mil. É uma cidade inteira dizimada. Famílias que sequer puderam se despedir de seus entes queridos. Ontem, o atacante Éverton do Grêmio chorou a morte de seu avô, no Ceará. Não é possível que não nos solidarizemos.