Ainda não tive a sorte de conhecer Tabajara Ruas pessoalmente, mas minha sensação é de que somos velhos amigos - coisas que só a literatura explica. Quando a gente lê alguém (repare na expressão: "ler alguém") é como se essa pessoa passasse, de alguma forma, a fazer parte do nosso círculo de amizades. É isso o que acontece, frequentemente, com os grandes escritores.
E Tabajara é um dos grandes.
Enquanto escrevo, tenho aqui, diante de mim, a edição de bolso de "Varões Assinalados" (da Editora L&PM), que catei na prateleira e decidi reler depois da feliz escolha do novo patrono da Feira do Livro de Porto Alegre. Tabajara, além de ser um dos grandes, é a pessoa certa na hora certa para ocupar tão nobre função.
A feira, você sabe, foi ameaçada por falta de recursos. Ficou de fora da Lei de Incentivo à Cultura pela primeira vez na história, o que desencadeou uma mobilização em favor do evento - que é o mais tradicional do gênero no Rio Grande do Sul, com quase sete décadas.
Em meio ao imbróglio, que teve final feliz, depois de um susto e tanto, o embaixador da feira em 2023 precisava ser de alguém com a estatura de um Tabajara Ruas. Aos 81 anos, celebrados nesta sexta-feira (11), o autor é uma unanimidade e ostenta uma produção inquestionável, na literatura e no cinema.
Além de tudo, Tabajara é o responsável por algumas das mais belas passagens envolvendo temas que forjam a identidade sul-rio-grandense e a mitologia gaúcha. Posso provar:
"A sentinela abriu a porteira e o grupo avançou num trote parelho através do pátio até o branco vulto da casa. Desmontaram. As esporas afundaram nas poças de água. Um peão afastou os cães que latiam, apanhou as rédeas dos cavalos e conduziu-os em direção ao potreiro. Os quatro homens subiram os quatro degraus da varanda em passos simultâneos. Os ponchos respingavam o chão de madeira."
Quem abre um livro assim, em um capítulo intitulado "A viagem ao país dos centauros" (em "Varões Assinalados"), meu amigo, minha amiga, só pode ser patrono da Feira do Livro de Porto Alegre.