O homem, diziam, deveria ser firme, orgulhoso, duro, competitivo e até violento, se preciso fosse. Um pai, então, tinha de dar o exemplo: agir como provedor do lar, defender a honra e garantir o sustento da família. Se falhasse, haveria de ser taxado de frouxo, fracassado, incapaz. Era o fim.
Houve um tempo em que ser pai significava ser severo, impondo autoridade pelo medo. Demonstrar sentimentos? Jamais. Ser delicado e afetivo com os filhos? Em hipótese alguma. Pai era para educar, e isso definitivamente não incluía demonstrações de afeto (encaradas como fraqueza).
Homem, diziam, não chora. Pobre do menino que, durante anos a fio, sofreu todo o tipo de pressão da sociedade para ser o que esperavam que ele fosse. Sair dessa engrenagem sórdida era optar pela margem. Muitos sofreram calados, exercendo um papel que nunca quiseram.
Houve um tempo, em algum ponto do passado, em que ser pai era ser uma espécie de tirano doméstico. Um amigo na faixa dos 60 anos me contou que, quando o patriarca se sentava à mesa do jantar, todos deviam fazer silêncio.
Na casa onde meu "velho" cresceu, a vara de marmelo estava sempre à espreita. Aprendia-se na dor das surras, e, não raro, cabia ao chefe da família a tarefa de agredir. Açoitava-se por qualquer motivo (meu pai, talvez por ter sentido na pele tudo isso, nunca me bateu).
Respeito é bom, é verdade, e há quem diga que, no passado, havia educação de verdade, mas o custo foi alto demais para muitos filhos dessas gerações. Sei de gente que passou a vida inteira sem nunca ter recebido um beijo de seu pai. É triste.
Havia muitas certezas sobre os deveres do homem, a função da mulher, o lugar de cada um no tecido social. Era claro e sólido. Só que, de repente, tudo ficou turvo e líquido. As relações - como apontou o sociólogo polonês Zygmunt Bauman - passaram a escorrer pelos dedos. A insegurança tornou-se o cerne do sujeito pós-moderno. Nosso cerne.
A masculinidade tóxica, para usar uma expressão da moda, tombou, e muitos homens sentiram… alívio. Werner Schünemann, que está em cartaz neste fim de semana no Theatro São Pedro, em Porto Alegre, fala exatamente disso em seu primeiro monólogo. Por que, afinal, homens, meninos e rapazes precisam se reafirmar o tempo todo? Qual é o seu lugar no mundo atual? Parte da resposta, conclui o ator, está na nova paternidade.
Escrevendo este texto, lembro do dia em que o Daniel Scola apareceu com as unhas pintadas nas redes sociais. “Obra das meninas”, divertiu-se ele, um paizão. Recordo, também, de um primo querido que, volta e meia, manda fotos rolando no chão com as filhas, se deixando fantasiar e brincando de boneca.
Marcos Piangers, do livro "O Papai é Pop", escreveu “como é difícil para um homem virar um pai”. É preciso, segundo ele, "tirar a armadura para construir um castelo". E quantos castelos lindos já foram erguidos por aí...