Existem poucas maneiras de se avaliar corretamente o grau de maturidade de alguém. Não dispomos de parâmetros confiáveis para afirmar que um candidato reconheceu seus limites sem ufanismo ou sofrimento, mas como um produto genuíno de autoavaliação que dispense o discurso vazio das homenagens.
A verdadeira maturidade resulta da descoberta de que, por mais que nos consideremos ótimos fazendo o que fazemos, sempre haverá por perto, e em geral de modo silencioso, um danado que fará, e ainda melhor, o que nos orgulhava tanto. E esta consciência arrastará todos os elogios que recebemos para a vitrine envergonhada do exagero.
Além disso, a julgar pelo alto percentual de pessoas com dificuldade de elogiar seus pares, o elogio implica em um esforço sobre-humano. Como é politicamente correto elogiar, algumas propostas ficaram famosas como úteis em emergências, apesar de assumidamente cínicas, como a do genial Tancredo Neves, que recomendava que se elogiasse a própria esposa quando a alguém, querendo ser sedutor, não lhe ocorresse nada para dizer.
Nesse tipo de reverência, que eu chamaria pré-póstuma, é comum que o orador, discorrendo sobre os grandes feitos do homenageado, cometa o deslize de rotular o veterano como quem "inspirou" muita gente.
Como é sempre simpático elogiar alguém, algumas recomendações são convenientes ao discursista de plantão que pretenda conservar um mínimo de credibilidade.
Assim, não poupem adjetivos aos velhos que, pela inevitável redução da energia, se tornaram meros representantes do passado. Nesta fase da velhice sobram, nos discursos, as virtudes pretéritas. Essas que já significaram muito, mas agora não ameaçam ninguém.
Nesse tipo de reverência, que eu chamaria pré-póstuma, é comum que o orador, discorrendo sobre os grandes feitos do homenageado, cometa o deslize de rotular o veterano como quem "inspirou" muita gente. Supõe-se que depois desse atropelamento verbal toque um alarme em algum recanto da consciência, porque ele imediatamente corrige com um dissimulado "e continua inspirando", na expectativa de que não tenham percebido a gafe. Mas quem mais perceberá será a vítima, atingida por este ato falho como uma flechada cruel na sua já combalida autoestima.
Por todos os sobressaltos que frequentemente marcam esses discursos pretensamente elogiosos, mas que, desprovidos de afeto, mais deprimem do que encantam, a tradição recomenda que essas loas sejam arquivadas, como cristais entre algodões, à espera paciente de que o merecedor delas morra.
A partir desse desfecho natural, o elogio se torna emotivo, justo e generoso. Quanto mais não seja, porque a morte tem esse poder depurador do nosso legado, misturando caridosamente a vida que tivemos com a que gostaríamos de ter tido.
Quando é inevitável que alguém seja elogiado em vida, porque a omissão do orador atestaria a inveja de quem ignorou o mérito, só há uma condição para atenuar o sofrimento de quem tem dificuldades de reconhecer as conquistas alheias sem sofrer por elas: que o homenageado more bem longe, de preferência em outro país.
A proximidade física e a tendência inevitável a comparações fazem com que o invejoso sinta uma dor de morte se for constrangido a elogiar. Como o elogio contrariado é primo-irmão da inveja espontânea, não seja ingênuo de esperar reconhecimento de quem está convencido que o pódio não é lugar para você.
Então, que não se diga nada. A solidão do invejoso é um bom ninho para a sua dor.