O uso de nomes de "laranjas" para justificar gastos é procedimento clássico da lavagem de dinheiro, no Brasil e no mundo. Outro estratagema muito conhecido é a nominação de endereços de empresas que não existem, mas que por falta de fiscalização são beneficiadas por isenções governamentais diversas. Pois uma fraude revelada pelo Grupo de Investigação da RBS (GDI), dias atrás, consegue unir os dois tipos de estratégias criminosas. O jornalista Giovani Grizotti percorreu alguns Estados e demonstrou que o programa governamental Farmácia Popular (que distribui remédios gratuitamente ou por valores reduzidos a 22 milhões de brasileiros) está sendo minado por esquemas de desvio do dinheiro público.
A reportagem mostrou que 568 gaúchos supostamente retiraram remédios pelo Farmácia Popular numa cidade do Distrito Federal, Planaltina. Acontece que eles jamais estiveram lá, até porque não faria sentido viajarem mais de 2 mil quilômetros para pegar medicamentos que custam menos de R$ 10, se comprados. A investigação de Grizotti mostra que eles tiveram os nomes utilizados por farmácias credenciadas pelo governo federal para receber até 100% do valor de medicamentos entregues a doentes crônicos e idosos. Acontece que esses clientes não existem ou jamais buscaram os remédios. Foram usados numa listagem "fantasma", para que as drogarias recebessem dinheiro governamental sem prestar qualquer serviço.
A fraude também tem outra ponta: algumas das farmácias credenciadas que supostamente teriam entregue medicamentos a doentes também não existem. Estão fechadas. Ou seja, tinham seus nomes utilizados com o objetivo específico de receber verba governamental.
O desvio é prática comum, conforme auditorias da Controladoria-Geral da União (CGU). O mérito da reportagem foi mostrar pessoas que tiveram os nomes utilizados sem saber e de farmácias cujos endereços sequer existem. Além disso, o repórter acertou a compra de cadastros de CNPJ de drogarias fechadas, mas que seguem ativas no cadastro do Ministério da Saúde. Ou seja, prontas para serem usadas numa fraude.
Agora é esperar que os critérios de uso de dinheiro público em programas sociais sejam reforçados. A esperança, afinal, é a última que morre.