Com uma fatia pequena dentro das exportações de carne bovina para a China (em setembro, 4,22% do volume total), o Rio Grande do Sul igualmente sente o golpe trazido à atividade por conta do embargo à exportação ao país asiático. A forma não é tão direta quanto outras regiões do país, como a Central, mas como o setor é feito de vasos comunicantes, quando um fluxo interrompe, afeta os demais. Mais do que isso, é a demora na solução e a ausência de sinalização da outra parte que são o maior "custo" do processo. E alimenta especulações sobre o real motivo da falta de ação. No momento em que o governo determina a suspensão da produção voltada a atender a demanda chinesa, o principal efeito colateral é o atraso em um movimento natural do mercado gaúcho — que, importante ressaltar, tem suas peculiaridades em relação ao restante do país.
O final de outubro, início de novembro costuma ser o período de retomada dos valores pagos ao produtor, que habitualmente caem em setembro, em razão da oferta maior. Para liberar áreas para a soja (e que no inverno têm pastagens que alimentam o rebanho), os animais são vendidos e, diante desse volume ampliado, há recuo nas cotações.
— O que preocupa é que o impasse com a China pode atrasar essa recuperação de preço. Essa questão participa do cenário todo que está atrasando ou freando essa retomada — pontua Fernando Velloso, da FF Velloso & Dimas Rocha Assessoria Agropecuária.
O pecuarista, acrescenta, faz um planejamento com base nesse movimento. Além disso, o imbróglio com os chineses também fez com que o tamanho da queda nas cotações do boi gordo no período de safra fosse acima do habitual. Conforme o Núcleo de Estudos em Sistemas de Produção de Bovinos de Corte e Cadeia Produtiva (Nespro) da UFRGS, o recuo foi de 10% – normalmente, é de cerca de 2%.
— O pior de tudo isso é a incerteza. Mas essa determinação do governo brasileiro de suspender a produção foi estratégica. E uma reação — pontua Júlio Barcellos, coordenador do Nespro, acrescentando que esta foi a primeira semana em que o preço do boi gordo parou de cair desde 15 de setembro.
A suspensão das exportações para a China veio em resposta, conforme mandam os protocolos, ao registro de dois casos atípicos de encefalopatia espongiforme bovina (conhecida popularmente como mal da vaca louca). Tudo foi feito pelas autoridades sanitárias do Brasil "como manda o figurino". Logo depois a própria Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) manteve o status do Brasil como sendo de "risco insignificante" à doença. Tudo isso fez crescer a expectativa de que a interrupção das vendas logo seria resolvida. Foi assim em 2019, quando a retomada, após situação semelhante, veio depois de 13 dias.
Agora, já são mais de 40 dias de portas fechadas, um cenário que preocupa quando se tem um destino com tamanho apetite. Dados da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec) mostram que, em setembro, 52,91% de toda a carne bovina vendida pelo Brasil foi para o país asiático. A primeira consequência, ainda não refletida nos números, será a da redução desses embarques (há um lapso de tempo entre a saída do Brasil e a chegada na China). Outra, já sentida no mercado interno, é a do recuo expressivo nas cotações no Brasil Central.
— Quando tem piora no resto do Brasil, somos afetados — reforça Velloso.
A permissão dada pelo governo nesse ofício circular, para estocar o produto parado em contêineres refrigerados é um paliativo que, todavia, representa custo extra.