Convivi, na época da escola, com um garoto que escrevia mal. Pode parecer apenas um fato da vida: alguns são bons com as palavras, outros não tanto, e assim vamos levando. Mas para um estudante do Ensino Médio (na época, Segundo Grau) que em breve prestaria vestibular, tirar uma boa nota em redação era fator decisivo para entrar na universidade.
Moisés não era um mau aluno. Muito pelo contrário: era inteligente, dedicado, com raciocínio apurado e bem articulado. O problema era aquela maldita forma de traduzir os pensamentos em uma sequência de letras, espaços e sinais gráficos chamada texto dissertativo.
Tentei ajudar Moisés de alguma forma, mas a verdade é que eu não sabia como. Escrever bem me parecia uma espécie de dom que se tem ou não. Da mesma forma como eu não esperava melhorar minhas notas em biologia ou química, apesar da assessoria que Moisés, em retribuição, me oferecia.
Os professores da escola e do cursinho pré-vestibular bem que tentavam ensinar técnicas e manhas, mas Moisés, que era bom com as exatas, acabou desenvolvendo uma fórmula própria, simples e genial, para passar na redação do vestibular: decorou certa ordem de palavras de ligação. Começava com uma frase, depois usava "e", mais uma frase e vinha um "entretanto", e assim por diante, até que, lá no final, o "logo" precedia sua conclusão. E assim Moisés, que ia bem na maioria das outras matérias, atravessou seu Mar Vermelho e chegou à universidade.
Mas aí aconteceu uma coisa surpreendente. Os anos foram passando, e ele foi lidando cada vez melhor com as palavras. Chegou uma hora em que seus relatórios no trabalho se tornaram organizados, com estilo limpo e de fácil entendimento. Moisés aprendeu a escrever de verdade, sem precisar recorrer a uma fórmula pronta.
Foi talvez a maior lição que ele, pelo exemplo, me ensinou. Algo que (depois descobri) os pesquisadores comprovam: independentemente do "dom", é possível se aprimorar, e muito, por meio do suor. Não é autoajuda, é ciência. A psicóloga Carol Dweck mostra que as crianças progridem mais quando acreditam que podem melhorar. Por isso, deve-se elogiá-las não pelo talento ou pela inteligência, que parecem algo imutável, mas pelo esforço, que pode transformar vidas.