Faz pelo menos meio ano que ninguém no Brasil pisa em uma sala de espetáculos para ver teatro. Ou dança. Ou circo. É um golpe duro nos artistas da cena e técnicos, que perdem sua fonte de sobrevivência, mas também no público, que já está com saudade de seu lugar na plateia. A impossibilidade da experiência presencial lança uma interrogação sobre as artes cênicas, pois os teóricos sempre destacaram o encontro entre público e artistas como uma singularidade dessa experiência.
Quem frequenta teatros em Porto Alegre sabe a delícia que é descobrir um promissor grupo novo, confirmar sua admiração por algum artista em um trabalho excepcional e até mesmo se decepcionar de vez em quando, porque isso também faz parte. Não quero que minha experiência como espectador seja previsível. O risco torna ainda mais recompensador quando o público acerta em sua escolha.
Apesar dos pesares, a pandemia de coronavírus está provocando uma expansão nas fronteiras do que é teatro, dança ou circo. Talvez seja mais preciso dizer que está difundindo ainda mais algumas reflexões que já existiam antes. Será que o encontro entre artistas e público não pode ser também pela internet? Não há formas de traduzir para a linguagem audiovisual um pouco da experiência da cena, mesmo que jamais substitua o espetáculo presencial? Muitos grupos estão se reinventando – palavra da moda – em lives teatrais, webséries, bate-papos, vídeos sobre bastidores e processos de criação. Ou, ainda, colocando gravações de espetáculos históricos na íntegra no YouTube.
E o público? Tenho certeza de que continua acompanhando os nomes que admira, mesmo que não possa, por enquanto, sentar na plateia, conversar com os conhecidos na fila ou tomar um chope artesanal antes ou depois da sessão.
Uma das maiores saudades é do clima dos festivais, o que o 27º Porto Alegre em Cena vai ajudar a aplacar, de 21 a 31 de outubro, com uma programação especialmente desenhada para tempos de pandemia. Serão atrações online, performances sem aglomeração e outras novidades. Um festival como ainda não havíamos imaginado. Também o público sairá desta pandemia se enxergando de forma diferente, expandida.