Fenômeno em meio à política de distanciamento social para combater o coronavírus, as lives têm garantido vida cultural para os artistas e o público. Com produção grandiosa ou desencanada, os shows ao vivo transmitidos pelas redes sociais trazem alento para as pessoas em um momento tão difícil e ainda abrem uma inédita janela para a intimidade dos artistas. Quando a transmissão é de casa, vislumbra-se a decoração das paredes, as prateleiras de livros, um pouco de suas vidas privadas.
Virou lugar-comum dizer que há lives para todos os gostos, mas há mesmo: dos fãs de sofrência aos amantes da MPB, passando pelos ouvintes de música erudita, praticamente todos estão bem servidos. Fora da música, escritores têm realizado leituras de suas obras e artistas do palco têm realizado encenações caseiras, mas caprichadas – a Coordenação de Artes Cênicas (CAC) da prefeitura de Porto Alegre, por exemplo, está com um ciclo de leituras dramáticas em vídeo de textos da gaúcha Vera Karam (1959-2003) no site maisteatro.org, produzidas por diferentes artistas e grupos.
Para cantores de grande apelo de público, que estão no topo das audições e visualizações das plataformas digitais, as lives atraem patrocínios, parcerias com canais de televisão e ainda mais popularidade. Essa realidade é bem diferente para artistas independentes, para os quais as lives funcionam mais como uma forma de se manterem próximos do público, não necessariamente sendo recompensados financeiramente por seus trabalhos. Esse é o outro lado da questão.
Situação difícil de equacionar, que vem na esteira de um contexto de transformações no financiamento à cultura. Na música, a mudança tecnológica da mídia física para a digital – as plataformas de streaming – reduziu drasticamente a renda obtida com a venda de CDs. Junte-se a isso o drama dos independentes, de todas as áreas da cultura, com o secamento das torneiras do financiamento público ao setor, decorrência de uma crise nas finanças dos governos.
O negócio da cultura e do entretenimento ao vivo não é feito apenas pelos artistas que aparecem no palco – e agora nas lives –, mas também por uma numerosa equipe de técnicos, produtores e outros profissionais, muitos dos quais também estão sem renda neste período.
É um tempo de poucas respostas fáceis. O que sabemos é que, quando um artista faz uma live, é porque não pode viver sem a sua arte. Devemos estar perto dele e dela, prestigiando, interagindo, para que possamos nos rever pessoalmente quando for seguro para a saúde de todos. Que este momento passe logo.