O Rio de Janeiro foi fundado por um desembargador corrupto, que andava armado e mandou matar muita gente. Formado em Leis na Universidade de Coimbra, Mem de Sá serviu-se da teia de ligações familiares para ascender ao Desembargo do Paço, sem jamais descuidar-se da carreira de armas. Ficou conhecido como “homem de toga e espada”. Estreitou relações com o rei D. João III e em 1557 foi nomeado governador-geral do Brasil. Expulsou os franceses, fundou o Rio de Janeiro, afogou em sangue uma rebelião indígena na Bahia e pôs ordem na casa. Inaugurou a política do “roubo, mas faço”. Ao morrer, após 14 anos no poder, Mem de Sá se tornara o homem mais rico da colônia e seu vasto patrimônio – em terras, gado e escravos – era incompatível com seus rendimentos, apesar de ter conseguido acumular os emolumentos de desembargador.
Mem de Sá pavimentou o caminho para que seu primo Salvador Correia de Sá se tornasse o primeiro, todo-poderoso e temido “rei do Rio”. Homem violento e incontrolável, Correia de Sá mandou na capitania por 22 anos. De costumes dissolutos, viciado no carteado, paranoico e persecutório, ele é o governador da Ilha “do Governador”. Mas não era dono só dela: mais da metade da atual área urbana do Rio lhe pertencia. Entre Mem de Sá e Salvador Correia de Sá, o Rio foi governado por Antônio de Salema, também desembargador da Casa de Suplicação. Esse dizimou os tamoios que viviam ao redor da Lagoa Rodrigo de Freitas dando-lhes roupas contaminadas por varíola.
Portanto, não dá para dizer que a culpa é do Cabral. Pois quando Sérgio Cabral assumiu, em 2006, o Rio já tinha sido joguete nas mãos dessa gente e de Garotinho marido e de Garotinho “conje”, embora ainda não houvesse trocado a mão grande pelo pezão. Mas o que pode se comparar ao governador, juiz e coronel, que mandava “mirar na cabeça”, dançou junto ao cadáver do “bandido” abatido e saqueou as verbas da saúde em plena pandemia? O que se compara ao clã político de pai para filhos que emprega e condecora milicianos, ergueu pequeno império imobiliário com dinheiro vivo e saiu do Rio para tomar o Brasil de assalto?
Não é difícil entender por que o Rio de Janeiro anda tão podre quanto o Rio da Carioca, curso d’água sagrado para os tamoios, que agora escoa feito valão. Mas triste mesmo é o fato de a cidade ter perdido, faz três dias, uma grande chance de evoluir. Afinal, a deputada Cristiane Brasil – nome autoexplicativo – não queria abrir mão de sua candidatura à prefeitura do Rio, mas foi impedida de concorrer. Como ela está na cadeia, o bom povo carioca poderia eleger um prefeito que já está preso. Isso queimaria etapas e agilizaria o processo.
Quem sabe não fica para 2022?