Pra não dizer que não falei de flores, asseguro que não esqueci ser hoje o Dia dos Namorados e que – ao contrário do pesadelo descrito por Mário Corso em coluna publicada na minha, na sua, na nossa ZH – sigo em lua de mel ao longo dos 70 dias pelos quais já se prolongam esse confinamento. Vivemos aqui sugando o néctar do amor, saltitantes de flor em flor e de folha em folha dos livros que lemos e escrevemos juntos, tão logo saímos da cama ou da mesa.
Mas isso não nos impediu de, cidadãos ativos que somos, seguir o exemplo do italiano Domenico de Masi (autor de O Ócio Criativo) e criar uma nova versão do método: o ódio criativo. Mesmo de casa, seguimos na luta contra um dos mais repugnantes, nefastos, retrógrados, hipócritas e desprezíveis governos da história do Brasil. E, sem sair do quarto, da sala ou da cozinha, julgamos que é chegada a hora de constranger aqueles que o ajudaram a chegar ao poder – e ainda não se arrependeram.
E não me vem com esse papo de que “era ele ou o PT” que eu próprio às vezes acho que criei o “gabinete do ódio do bem”, do coração do qual sempre combati e critiquei os descaminhos e desvãos dessa organização político-religiosa, aliás bastante responsável pela chegada ao poder da excrescência que lá se encontra.
Antes de alimentar meu ódio criativo contra esses dois aí, havia voltado minhas baterias para o glorioso Exército Nacional. Não sem razão, pois os milicos estavam no poder e haviam mergulhado o Brasil na escuridão da ditadura. Mas quando eles voltaram para seu devido lugar – a caserna – e passei a estudar com afinco a história do Brasil, aprendi a respeitar as Forças Armadas, em especial a Marinha (da qual ganhei medalha de “amigo”).
É por isso – e também por meu apreço pelo jornal O Estado de S Paulo (onde trabalhei anos e também fui feliz ) – que, em pleno Dia dos Namoradores, em vez de tecer loas e boas ao amor carnal e espiritual, me permito citar trechos do editorial desse jornal paulista de 145 anos, que sempre foi um baluarte do conservadorismo e já foi taxado de tudo, mas que os canalhas devem agora chamar de “comunista”:
“Se fazia algum sentido o apoio a Bolsonaro no pleito de 2018, é de estranhar a permanência de militares da ativa e da reserva em cargos do governo federal, passado um ano e meio de mandato, tempo mais do que suficiente para o presidente mostrar quem, de fato, ele é. Jair Bolsonaro jamais comandou tropa e saiu do Exército em desonra. Personifica valores e comportamentos diametralmente opostos aos dos militares, como decoro, disciplina, respeito às instituições republicanas e reverência à Constituição”.
Faço minhas tais palavras. E sigo aqui alimentando o ódio. Com muito amor, é claro.