Entrar, acho que nunca entrei na Igreja São Geraldo. Nem sei o que este santo, o Geraldo, fez de bom para ser beatificado. Para mim, o Geraldo mais famoso é um que foi meia do Flamengo, nos tempos do Zico. Era craque, mas morreu jovem, durante uma vulgar operação de retirada das amígdalas.
Conheço, pelo lado de fora, a Igreja São Geraldo desde que era guri. Meu avô morava no bairro dos Navegantes e, às vezes, caminhava comigo pela Farrapos, contando histórias. Quando chegávamos perto da igreja, puxava-o pela mão e parávamos só para que eu admirasse a estátua do Cristo que está encarapitada no alto da única torre do templo. Sempre achei a estátua linda e meio misteriosa, porque as pessoas não a veem. Ninguém olha para cima naquele ponto da avenida movimentada e cinzenta. Só mesmo alguém que esteja passeando sem destino para se deter na calçada, olhar para o alto e examiná-la com critério.
O Cristo está lá, com o braço estendido, abençoando a cidade que mal toma conhecimento da sua existência. Por que Porto Alegre não festeja o seu Cristo Redentor?
Pensei mais uma vez nisso agora, neste dia 12, quando o Cristo Redentor do Rio completou 90 anos de existência. Gosto do Cristo carioca. É um monumento imponente e delicado ao mesmo tempo. E o melhor: ele é redentor. Quer dizer: ele redime os pecados do Rio, os pecados do Brasil, os nossos pecados. Rubem Braga, numa de suas crônicas mais famosas, “Ai de ti, Copacabana!”, escreveu:
“A água salgada levará milênios para lavar os teus pecados de um só verão”.
Enganou-se, o velho Braga. O Cristo está lá em cima, no Corcovado, vendo tudo e a tudo perdoando.
Pois tenho cá para mim que o nosso Cristo, o que se eleva na torre da Igreja São Geraldo, também nos redime. É verdade que ele está de costas para a maior parte da cidade. Seu braço estendido e sua mão espalmada lançam bênçãos para uma estreita franja de Porto Alegre e, em seguida, para o rio que nos mata a sede e lava nossos corpos. Mas quem nunca passou sob seus pés? Até os estrangeiros, que descem no aeroporto, rumam para o Centro pela Avenida Farrapos.
Então, as dádivas do nosso Cristo estão à disposição de todos. Não duvido que besuntem até quem o ignora, quem jamais o viu, mesmo tendo nascido aqui. Mas tenho certeza de que serão mais poderosas para quem o contempla. Você, pecador, faça algo por sua própria alma imortal. Admire o nosso Cristo Redentor. E sinta o coração leve, nem que seja uma única vez na vida.