Se você parar para ver os telejornais, inevitavelmente assistirá às reportagens sobre a vacina contra a covid-19. E, nessas reportagens, verá meia dúzia de vezes a cena daquela agulha entrando no braço de quem se vacina. É uma agulha comprida. Terá... o quê? Uns quatro centímetros? Por aí. E os enfermeiros introduzem-na inteira no músculo da pessoa, antes de premer o êmbolo da seringa.
Contei, outro dia, na rádio, que a Marcinha não pode ver essa cena. Quando vê, ela geme, “ai!”, e vira o rosto para o lado.
Foi eu contar isso e vários ouvintes me mandaram e-mails dizendo que eles também têm problemas com a visão de agulhas penetrando braços indefesos. Trata-se do ancestral medo de injeção, que nos assola desde a infância.
Fiquei pensando se, diante daquela cena, alguns não desistem de tomar a vacina por medo da picada. Porque tem de haver um motivo psicológico profundo para os que se negam a se vacinar, que não são tão poucos assim.
Até entendo que o princípio da vacina pode ser assustador. Afinal, um simulacro da doença é inoculado em você a fim de alertar o seu sistema de defesa. Isso é perturbador. Na Revolta da Vacina, de 1904, até cabeças privilegiadas, como a de Ruy Barbosa, se rebelaram contra essa ideia. Em discurso no Senado, ele vociferou:
“Assim como o direito veda ao poder humano invadir-nos a consciência, assim lhe veda transpor a epiderme. Logo, não tem nome, na categoria dos crimes do poder, a temeridade, a violência, a tirania a que ele se aventura, expondo-se, voluntariamente, obstinadamente, a me envenenar, com a introdução no meu sangue de um vírus em cuja influência existem os mais fundados receios de que seja condutor da moléstia ou da morte!”
Mas isso foi há quase 120 anos. De lá para cá, as pessoas se acostumaram a tomar vacinas. O meu filho, quando nasceu, estava nos meus braços depois de ter tomado seu primeiro banho, quando a enfermeira veio de lá com uma injeção GIGANTE.
— O que é isso? — perguntei, receoso.
— Vacina.
E, em seguida, sem me dar muita atenção, ela simplesmente tomou a perninha do menino e lhe enfiou aquela lança, tão grande que acho que poderia atravessá-lo. Meu filho, obviamente, começou a chorar, chocado com aquela primeiríssima agressão do mundo exterior, enquanto eu tentava consolá-lo, embalando-o. Quando finalmente consegui fazer com que ele se acalmasse, a enfermeira voltou com outra injeção.
— Mais uma vacina? — me surpreendi.
— Mais uma — ela disse, e rapidamente tomou a outra perninha do menino e PÁ!, deu-lhe outra agulhada. E o meu filho, mais uma vez, caiu num pranto entremeado de soluços, constatando, tão cedo, que aqui é mesmo um vale de lágrimas.
De lá para cá, ele tomou dezenas de vacinas. Dezenas. Aí é que está: todo mundo toma vacina. Por que esse drama, agora, com a necessária vacina contra a covid-19? Vocês não entenderam ainda que todo mundo tem de se vacinar para podermos sair juntos dessa enrascada? Chega de medinho! Chega de frescura! Vai se vacinar, rapaz!