O filósofo Bertrand Russell morreu de gripe. Parece improvável que alguém morra de gripe, mas ele já estava bem velhinho, perto dos cem anos de idade. Por ter passado tanto tempo neste planeta azul, Russell produziu muito. Escreveu artigos e livros, deu aulas, ensinou de várias maneiras. No entanto, duvido que qualquer pedaço da sua obra tenha alcançado mais popularidade do que um breve vídeo que há anos circula pelos corredores da internet. É um trecho de menos de dois minutos de uma entrevista que Russell concedeu a alguma emissora de TV. O entrevistador perguntou que lições o filósofo deixaria às gerações futuras. Russell disse que seriam duas: uma intelectual, outra moral.
A lição intelectual é a seguinte: quando você está analisando um assunto, pergunte-se qual é a verdade que os fatos revelam e nunca se deixe divergir da conclusão pelo que você gostaria de acreditar que fosse verdade.
Ou seja: às vezes, a realidade não corresponde ao seu desejo. Então, fique com a realidade, não com o desejo.
No caso brasileiro, os fatos demonstram um punhado de realidades indesejáveis, que você tem de admitir. Eis três das mais relevantes:
1. Moro, muitas vezes, agiu de forma coordenada com o Ministério Público durante a Lava-Jato. Isso já era óbvio antes e tornou-se cristalino agora, com a revelação das mensagens eletrônicas pelo site Intercept. Você pode alegar que, se ele não fizesse assim, não conseguiria desbaratar a poderosa quadrilha que se apropriava de recursos do Estado. Talvez você tenha razão, mas esse tipo de procedimento não é ético para um juiz.
2. As mensagens que foram divulgadas mostram ação irregular de Moro, mas não absolvem ninguém que ele condenou. Nenhuma prova foi forjada, nenhum crime foi inventado. Não existe a menor dúvida de que a corrupção estava infiltrada no Estado, e o corroía rapidamente. Não existe a menor dúvida de que essa corrupção era um método de governo e um projeto de poder. Não existe a menor dúvida de que a Lava-Jato foi um enorme avanço para o Brasil.
3. Bolsonaro não está preparado para ser presidente da República. Foram diversos os fatos que revelaram essa verdade nestes últimos seis meses. Provavelmente, nenhum mais eloquente do que a maneira como Joaquim Levy saiu da presidência do BNDES, neste fim de semana. Sem ser perguntado, Bolsonaro declarou à imprensa que estava "por aqui" com Levy e ameaçou demiti-lo em dois dias. É claro que Levy pediria demissão, como pediu. Definitivamente, não é uma forma apropriada de gestão. Foi humilhante para Levy, foi preocupante para todos os outros colaboradores do governo, foi constrangedor para quem espera uma governança equilibrada do chefe do Executivo.
Diante dessas três verdades demonstradas pelos fatos, resta a grande questão: o que nos aguarda, no futuro? Sendo tudo tão negativo, de onde poderemos extrair um resultado positivo?
Digo que podemos. Basta seguir o primeiro conselho de Russell e examinar os fatos mais como eles são do que como gostaríamos que fossem. E, se possível, seguir também o segundo conselho que ele dá na entrevista, o conselho moral. Que é o seguinte:
"O amor é sábio, o ódio é tolo. Neste mundo, que está ficando mais e mais interconectado, nós temos de aprender a tolerar uns aos outros, nós temos de aceitar o fato de que algumas pessoas dizem coisas das quais não gostamos. Assim poderemos viver juntos, e não morrer juntos. Nós precisamos aprender a bondade da caridade e da tolerância, o que é absolutamente vital para a continuidade da vida humana neste planeta".
E é isso. Lembre-se. Não se deixe enganar: o amor é sábio, o ódio é tolo.