O Professor Juninho está internado em um hospital de São Paulo. Temos o hábito de louvar as pessoas depois de mortas, e o Juninho está vivo e vivo espero que continue, e bem, mas me preocupo com sua saúde, é o que tem ocupado minha cabeça nesses dias e, assim, escrevo a respeito. Quero que ele leia e se divirta com a coluna, como tem acontecido nos últimos 20 anos.
Na verdade, mais de 20 anos.
Desde que comecei a escrever crônicas em Zero Hora, falo do Professor Juninho. Transformei-o em personagem. Uma vez, depois de relatar um punhado de suas peripécias, em geral amorosas, prometi aos leitores que iria divulgar o celular dele, um número por coluna. E comecei: "O primeiro dígito é… 9!". O Juninho se assustou:
— Tu vai revelar o número mesmo?
— Eu prometi!
No dia seguinte, tasquei: "O segundo dígito é… outro 9!". E assim por diante. Minha coluna saía duas vezes por semana, torturei o Juninho durante um mês. No final, quando completei o número, ele recebeu a primeira das centenas de ligações de leitores às cinco da madrugada. Em compensação, paguei os chopes da noite. Mas ele nem ficou brabo. Ao contrário: duas das ligações eram de leitoras pelas quais ele se interessou e que, mais tarde, renderiam novas crônicas. Era assim: o Professor Juninho rendia histórias a mancheias.
Certa vez, criei uma seção na coluna, o Consultório Sentimental do Professor Juninho. Claro que era para brincar com os leitores. A ideia era o personagem meio cafajeste dando conselhos meio cafajestes sobre relacionamentos. Por exemplo: um dia, um leitor enviou uma carta perguntando: "Querido Professor Juninho: sou um cara muito, muito, muito feio. Como faço para conquistar as mulheres? Obrigado, Luiz Carlos". Respondi, pela boca do Juninho: "Querido Luiz Carlos. Felizmente, as mulheres são mais generosas do que nós. Você pode ser muito, muito, muito feio e ter uma vida amorosa muito, muito, muito animada, desde que seja muito, muito, muito rico".
Apenas gozação, óbvio. Mas os leitores passaram a levar a sério. As pessoas REALMENTE faziam o que o meu personagem mandava fazer. Aí fechei o consultório sentimental.
O Juninho lia essas crônicas e ria. Nunca reclamou de uma perna de cedilha sequer. Por dois motivos. Primeiro, porque ele é dotado com o maior predicado das pessoas inteligentes: o bom humor. Segundo, porque nossa amizade é sólida como a zaga formada por Kannemann e Geromel.
Nossa convivência era diuturna. De dia, na RBS, onde ele também trabalhava. De noite, numa mesa de bar, nas quadras de futebol sete ou à beira da piscininha da casa dos pais dele, no bairro Petrópolis, onde fizemos festas que se tornaram lendárias. Nem nas férias nos separávamos: eu, o Juninho, o desembargador Eduardo Delgado (o Degô) e o meu irmão Régis alugamos, por nove verões a fio, uma casa na Praia Brava, em Floripa. É evidente que parte do que aconteceu naquela casa aterrissou nas páginas de Zero Hora. A parte publicável.
Depois, o Juninho acabou se mudando para São Paulo, mas continuamos nos vendo sempre que possível. Há seis anos, quando descobri que estava com um câncer, fui fazer tratamento em São Paulo e fiquei hospedado em sua casa. Via, no rosto do meu amigo, como ele se sentia angustiado com minha situação. Três meses depois, o mesmo diagnóstico desabou sobre sua cabeça. Eu e o Degô fomos para São Paulo no dia em que o Juninho se submeteu à cirurgia. Sentamos em poltronas no quarto dele durante a recuperação. O Juninho sentia muitas dores. Mas começamos a relembrar certas histórias e, em minutos, ele gargalhava tanto, que a enfermeira ficou com medo que os pontos arrebentassem.
Esse câncer, contra o qual ele luta com uma coragem e uma leveza que só os grandes têm, esse câncer, agora, o levou para o hospital e eu, por várias razões, não posso viajar para lá neste momento. Estou a 8 mil quilômetros de distância, mas não paro de pensar no meu amigo. Professor Juninho. Que, aliás, não se chama Junior. O nome dele é Luis Fernando Gracioli. Acrescente esse nome nas suas orações, leitor. Torça por ele como estou torcendo. E nem faça isso por mim. Faça como uma homenagem a um sentimento que é uma das nossas razões de existir. Faça como uma homenagem à amizade.