O Professor Juninho, certa vez, decidiu abrir um bar em Porto Alegre. Fiz firme oposição.
– Juninho – argumentei, depois de beber um gole de chope cremoso, gelado e dourado –, nós não fomos feitos para ter bar, nós fomos feitos para ir a bar.
Não adiantou. Ele abriu o bar. E, em seis meses, faliu, claro. Neste processo, quase que foram à falência também os relacionamentos amorosos de todos nós, seus amigos, porque tínhamos de ser solidários com ele e acompanhá-lo nas noites de trabalho árduo. Um desses amigos, depois de ajudar o Juninho a fechar o bar durante semanas seguidas, ouviu o seguinte da mulher:
– Tudo bem chegar tarde, mas com os passarinhos cantando, não! Não admito meu marido chegar em casa com os passarinhos cantando!
Uma cidade se faz caminhando, mas, mais do que isso, se faz caminhando e parando. É um exercício de humanidade.
Nosso amigo resolveu o problema fincando um espantalho no quintal de casa.
O erro cometido pelo Professor Juninho é useiro e vezeiro entre jornalistas. Ou, pelo menos, entre velhos jornalistas, porque quase todos nós sonhávamos em ter um bar, uma pousada em Santa Catarina ou uma livraria.
Aí está: nesta semana, os meus amigos Ivan Pinheiro Machado e Paulo Lima, os fundadores da editora L&PM, lançaram sua livraria, a Pocket Store, na Félix da Cunha, bem no pâncreas do Moinhos de Vento, o bairro mais bonito da cidade, depois do IAPI.
É um sonho que se materializa, sobretudo por se tratar de uma livraria de calçada. Porque a cidade precisa desses pontos de encontro. Uma cidade se faz caminhando, mas, mais do que isso, se faz caminhando e parando. As pessoas saem à rua, flanam ao ar livre, se reconhecem, se detêm e conversam. É um exercício de humanidade. Esse tipo de atividade distensiona os cidadãos e torna a cidade mais aprazível.
Por que as pessoas amam Paris? Porque em Paris se caminha. Você flutua pelas alamedas, olhando para os bares, para os cafés, para os antiquários, para as livrarias. Você caminha, para, toma um café; caminha, para, entra numa loja; caminha, para, folheia um livro. Um dia que você usufrui assim não é um dia gasto, é um dia ganho, é um dia em que você se tornou mais gente.
Poder zanzar pela rua e, de repente, ver-se dentro de uma livraria de calçada é a glória de uma cidade. Você no meio de todas aquelas histórias, elas se oferecendo para você, você antevendo o prazer de beber do que elas dão. Parabéns aos meus amigos Ivan e Lima. Parabéns a Porto Alegre.
Pedido para o prefeito e o governador
Já que estamos falando de livros, livros à mancheia, como diria Castro Alves, faço aqui uma súplica ao prefeito Nelson Marchezan e ao governador Eduardo Leite: por favor, deem uma olhada na Biblioteca Pública Romano Reif, que fica num ventrículo do coração do bairro mais belo da cidade, o IAPI, aquela biblioteca onde me cevei à grande na infância, incrustada na frente do histórico estádio do Alim Pedro, onde dava meus lançamentos de 60 metros, como Rivellino, a Patada Atômica, deem uma olhada na biblioteca que sofre com vazamentos, tendo os bibliotecários de cobrir os livros com feias lonas pretas, tendo de lutar contra o mofo e o mau cheiro, olhem pela pequena biblioteca, prefeito e governador, trata-se de um conserto fácil e barato, olhem por ela e benditos sejam, porque, como diria Castro Alves, vocês semearão livros e mandarão o povo pensar.