Nos anos dourados da faculdade, nós saíamos das aulas e íamos para o Mazza, bar que ficava atrás da PUC, do outro lado da Bento Gonçalves, no Partenon. Sentávamos em mesas compridas de churrasco, pedíamos cerveja e começávamos a traçar planos infalíveis para derrubar o governo e salvar o Brasil. Aquelas noitadas, aquela convivência, aquelas discussões nos fizeram crescer mais do que qualquer conteúdo que nos tivesse sido ensinado pelos professores. Porque o conhecimento é fácil de adquirir. Basta ter um pouco de tempo, disposição e boas indicações de leitura. Mas observar como pessoas diferentes processam de modo diferente a mesma informação, ouvi-las argumentando e argumentar com elas, é isso que dá estofo ao pensamento.
Lembro que tínhamos muita esperança no Brasil, que sonhávamos com o fim da longa noite da ditadura militar e com a luz da redemocratização. Mas isso não nos diminuía o natural ceticismo brasileiro. "O problema do Brasil é a impunidade", dizíamos. "Os poderosos nunca vão ser punidos por seus crimes". De fato, no Brasil, todo mundo sempre soube o que se fazia de errado e quem fazia de errado, e todo mundo sempre se conformou, repetindo: "Nada vai acontecer, o Brasil é assim mesmo".
Era.
Não é mais.
A prisão de Temer, decretada ontem pela Operação Lava-Jato, elevou o Brasil a novo patamar de nação. Empresários riquíssimos e políticos poderosíssimos já tinham sido presos, é verdade. Tinha sido preso até o mais poderoso e popular deles, Lula. Mas Temer faz parte de outra casta da elite brasileira.
Lula, não apenas por sua origem, mas pela sua forma de atuação, era mais vulnerável do que Temer, embora fosse também mais forte. Lula tinha força devido à sua popularidade e devido à sua popularidade era odiado. Se Lula fosse insignificante, ninguém se incomodaria com ele.
Temer, nas aparências, é insignificante. Era um político das sombras, das manobras de antessala. Temer tinha influência e poder, não visibilidade. Ganhou visibilidade ao assumir a presidência da República devido ao impeachment de Dilma. E, então, algo curioso aconteceu: o que era para ser sua glória foi sua danação. Dele e de todos os outros políticos pouco conhecidos e muito poderosos que esvoejavam em seu entorno.
Porque, encarapitado na presidência, Temer se expôs. Os olhares voltaram-se para ele e o Brasil o descobriu. Quem era aquele vice silencioso de quem ninguém falava? Quais era suas relações? Onde estava a fonte de seu poder? Até aquele momento, Temer e seus amigos partilhavam dos ganhos de quem tem influência sem pagar as taxas cobradas de quem tem o mando. Agora era diferente. Agora Temer estava sendo visto. Agora os dedos estavam sendo apontados para ele. Só assim essa esquiva linhagem de políticos tradicionais do Brasil foi alcançada pelo braço da lei. É uma mudança rotunda. Um avanço impensável para aqueles jovens que salvavam o Brasil nas velhas madrugadas do Partenon.