Não sou homem de mesóclises. Michel é. Jânio era. Cada qual com suas razões, é óbvio. Michel por ter sido professor constitucionalista – cada cauda de quê e cada pança de bê são decisivas para o constitucionalista. Além disso, todo mundo sabe, Michel comete sonetos.
Jânio também era professor, mas de português. Ele amava a gramática quase tanto quanto sua eterna companheira, dona Eloá. Que, aliás, o amava igual, a ponto de dizer a seu respeito:
– O Jânio é o homem mais feio que já conheci.
Uma mulher que diz isso do homem da sua vida é uma mulher que ama.
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Mas o que mais intriga é o seguinte: com o nível de educação que o Brasil tem hoje, é com a ideologia nas escolas que estamos preocupados?
Também gosto dela. Não de dona Eloá – da gramática. Mas não me escandalizo se uma frase começar por pronome oblíquo, por exemplo. Me apetece às vezes escrever como se fala. No entanto, sinto vontade de chorar quando alguém escreve "amigxs", numa pretensa luta contra o pretenso machismo da língua portuguesa. Não por causa da luta contra o machismo – por causa da agressão à última flor do Lácio, inculta e bela, como diria Olavo Bilac. Ela, nossa amada língua portuguesa, é docemente fonética: você precisa "ouvir" o que escreve. Ao meter um xis no lugar de uma vogal, você não ouve nem fala; você agride a língua.
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Nem toda mudança é melhora, nem tudo o que quebra paradigmas é evolução. Sou a favor de jogador de chuteira preta e camisa para dentro do calção. Esse meia que surgiu no Grêmio, Jean Pyerre. A despeito do ípsilon no nome, ele entrava em campo com a camisa para dentro do calção. Era alvissareiro. Por que mudou? Por que tirou a camisa para fora? Com a camisa para dentro, ele me lembrava Ademir da Guia. Você leu o poema de João Cabral de Melo Neto sobre Ademir?
"Ademir impõe com seu jogo
o ritmo do chumbo (e o peso),
da lesma, da câmara lenta,
do homem dentro do pesadelo.
Ritmo líquido se infiltrando
no adversário, grosso, de dentro,
impondo-lhe o que ele deseja,
mandando nele, apodrecendo-o.
Ritmo morno, de andar na areia,
de água doente de alagados,
entorpecendo e então atando
o mais irrequieto adversário".
Jean Pyerre pode ser merecedor de um poema desse quilate, um dia. Desde que mantenha a camisa para dentro do calção.
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Outra: sou contra chamar a professora de tia. Esse excesso de intimidade é o começo do processo de desrespeito ao professor. Não precisa ser como no tempo em que eu estava no primário, quando todos os alunos se levantavam no momento em que a professora pisava na aula. Mas o tratamento tem de ser um pouco mais formal. Aqui, nos Estados Unidos, os alunos às vezes nem ficam sabendo qual é o primeiro nome da professora. É senhora Dohane, senhora Baran, senhora Curtis.
O aluno tem de entender que, em aula, está subordinado ao professor, afinal.
Óbvio: isso não se alcança por lei. É a escola que tem de exigir. Leis não regulam costumes. Costumes é que moldam leis.
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O que me leva a pensar na votação dessa lei da Escola sem Partido. É claro que ninguém quer proselitismo político nas escolas, mas precisa de lei? Isso já não é proibido?
A maioria dos professores de história é de esquerda, é isso? E daí? O professor conta as histórias da História, o aluno chega a sua conclusão. Se há excessos, a escola pune. Como punirá o desrespeito ao professor. É assim que deveria de ser.
Mas o que mais intriga é o seguinte: com o nível de educação que o Brasil tem hoje, com gente entrando na faculdade sem saber interpretar um texto, com alunos dando socos nas "tias", é com a ideologia nas escolas que estamos preocupados? Eles não aprendem português e matemática, vão aprender marxismo? Por favor! Estamos mudando. Mas não estamos indo para a frente.