Vou repetir o que escrevi lá no primeiro semestre: nenhum time gaúcho jogou COMO este time do Grêmio joga. Nem o melhor time gaúcho que vi sobre um campo de futebol: o Inter dos anos 1970.
Friso, sublinho, ratifico e realço: o Inter dos anos 1970 era MELHOR, mas não jogava COMO esse Grêmio, espécie de Flamengo de Zico, de toco y me voy, de tiki-taka, de tá aqui-não tá mais aqui.
Escrevi também que um título o consagraria, e o time conquistou o maior deles, pelo menos até agora. Consagrado está.
Sabia que o Grêmio seria tricampeão da América antes mesmo do primeiro jogo da final. Não por adivinhação, informação privilegiada ou sabedoria superior. Bastava olhar: os sinais eram fortes. Todas as instâncias do clube estavam concentradas na decisão. Quando isso acontece, os méritos são de quem orienta: o Homem. O presidente. Romildo Bolzan soube conduzir o clube da quase bancarrota ao pódio de maior do continente. Com discrição e humildade, qualidades raras na vida pública, identificou erros seus e de gestões anteriores, corrigiu-os rapidamente e mostrou que há uma mão segura comandando o clube.
Todas as instâncias do clube estavam concentradas na decisão. Quando isso acontece, os méritos são de quem orienta: o presidente.
Outro dirigente importante foi Adalberto Preis, que apostou em quem poucos acreditavam: Renato Portaluppi.
Renato chegou para substituir um técnico que parecia o seu oposto. Roger faz parte da categoria dos treinadores "estudiosos", é discreto e nem um pouco dado às manifestações brejeiras que caracterizam Renato desde que ele foi jogador.
Mas o Renato que assumiu o Grêmio no ano passado foi um Renato diferente. Foi um Renato maduro, de surpreendente ponderação em suas declarações, que chegou a corrigir palavras mal assestadas.
– Não quis dizer "despencar" – explicou-se, quando se referiu ao Corinthians no segundo turno do Brasileiro. – Quis dizer "escorregar".
– Não quis dizer "o mundo é dos espertos" – reparou, no caso do drone espião. – Quis dizer "o mundo é dos inteligentes".
E, depois da conquista da América, recomendou que os torcedores fizessem festa "sem exageros". Renato pregando festa sem exageros, imagine.
Quando técnico e dirigentes têm a mesma sintonia, os jogadores sentem-se seguros – a autoridade (não o autoritarismo) dá confiança a povos, crianças, funcionários e meias de armação.
Confiantes, os jogadores puderam desenvolver suas qualidades. Talvez o maior símbolo desta confiança adquirida pelo grupo do Grêmio seja Bressan. Depois de falhar sucessivamente em várias partidas, Bressan foi emprestado ao Peñarol. Em pouco tempo, o Peñarol o devolveu, para desespero do torcedor gremista. A torcida, com boas razões, não podia ouvir seu nome sem estremecer de horror. Pois Renato afiançou:
– O Bressan fica e vai jogar.
E Bressan ficou e jogou. E bem. Na finalíssima, a torcida também estremeceu de horror por causa de Bressan. Mas foi quando ele se machucou e teve de sair de campo, não quando teve de entrar.
Outra prova concreta da tranquilidade que o clube passou ao time ocorreu aos 41 minutos do primeiro tempo da final, quando Luan recebeu a bola na intermediária de ataque, sem marcação. Se ele engatasse a quinta marcha e usasse a velocidade empregada por Fernandinho no primeiro gol, entraria livre na área. Mas a bola veio alta e Luan perdeu meio segundo para dominá-la. Esse átimo foi o suficiente para que três defensores do Lanús recuassem para participar da jogada. Luan nem ligou. Pôs a bola no chão como se estivesse de férias, como se assobiasse com a mão no bolso, com a naturalidade dos craques. E, com a naturalidade dos craques, meteu-se entre os três zagueiros, driblou-os e, na saída do goleiro, deu a famosa "cavadinha" para marcar 2 a 0.
O jogador tem de estar com a cabeça muito boa para fazer algo assim numa final de Libertadores. Luan está com a cabeça boa, todos os jogadores estão com a cabeça boa, porque os comandantes do clube têm cabeça boa.
Boas cabeças ganham títulos. Conquistam o mundo.