Volta e meia bate uma melancolia com a situação do mundo – imagino que todo mundo tem isso, alguns mais do que outros. Quando vem a tentação de desesperança, sempre recorro a textos do Carl Sagan. Ele foi, para mim, como para muitos, decisivo na escolha da carreira científica. Sagan tinha uma característica fundamental dos cientistas: uma capacidade se maravilhar com descobertas sobre a natureza. Somos treinados a não aceitar meias respostas, ou respostas enfeitadas; o entendimento real depende de conseguirmos reproduzir um fenômeno, muitas vezes, independentemente. Essa busca é extenuante, porque requer um ceticismo disciplinado. E, quando finalmente chegamos à resposta, vem aquela sensação de êxtase – que pode ser maior ou menor, dependendo da importância da pergunta que foi feita.
A pergunta de Sagan sempre foi sobre a existência de vida em outros lugares do universo. Ele criou diferentes programas para a Nasa com esse objetivo. Li nesta última semana que, há 30 anos, um artigo publicado por Sagan e colaboradores ensina como ser absolutamente cético sobre aquilo que mais queremos saber. Em 1989, a sonda Galileo foi lançada para buscar sinais de vida. Sagan convenceu a Nasa e apontar a sonda para o nosso planeta. A pergunta do artigo era: será que a sonda é mesmo capaz de detectar vida do espaço? Era como uma história de ficção científica – imagine que estamos vendo a Terra pela primeira vez. Como saber se sabemos mesmo como identificar os sinais? A gente quer tanto detectar vida, que é fácil ser enganado. Chamamos isso de um experimento controle – esse era o controle perfeito! Se a resposta fosse negativa, saberíamos que a sonda não funciona.
O experimento criou uma moldura para todas as buscas de assinaturas biológicas usadas hoje em dia: a existência de vida deve ser a última explicação plausível – precisamos eliminar tudo o que pode ser explicado de outro jeito. Muito inspirador. Preciso disso para lembrar que nós, humanos, somos capazes de algo assim. Porque quando penso que se o experimento fosse buscar vida inteligente não acredito que teríamos um bom controle.
O planeta hoje é um buraco negro de inteligência. Temos toda a ciência para entender as mudanças climáticas e ainda assim não existe acordo planetário para tomar medidas preventivas ou de remediação. E o pior, apesar de sabermos, por estudos de todas as áreas, o quanto a diversidade é a fonte da resiliência e força da espécie humana, não conseguimos conviver com as diferenças. Até quando seremos tolerantes com grupos e pessoas que fazem da intolerância a sua bandeira? Que acham que destruir vidas é a sua missão? Que não admitem coexistir e partilhar um ambiente com respeito mútuo?
Recebemos o dom maravilhoso da vida, mas ainda não dominamos a inteligência para vivenciar essa experiência na sua forma mais sublime. Mas nós sabemos como reverter isso. A solução passa por cada um de nós, diariamente, pensarmos menos em ouvir apenas o que queremos e nos dispormos a entender o outro, mesmo que esse seja o caminho mais extenuante.