Ok, finalmente aconteceu. Fizeram um T-1000.
Mesmo os que não são nerds de ficção científica devem se lembrar do robô que perseguia sem trégua o exterminador do futuro no filme do mesmo nome. Inesquecível, porque ele alternava entre os estados sólido e líquido de um metal que assumia todas as formas possíveis. Praticamente indestrutível.
Na semana que passou, a revista Matter publicou um artigo – com vídeo! – descrevendo esse tipo de substância, que, por ativação magnética, responde se remodelando e se direcionando. O vídeo brinca com a fantasia do T-1000 e mostra um pequeno robô, feito dessa matéria magneticamente ativa, escapando de grades ao se remodelar em resposta a campos de força. Recém começou 2023, mas fica o desafio: quem vai publicar um artigo científico, neste ano, que seja mais descolado que esse?
Entre o roteirista do filme original, os criadores das imagens e os cientistas que realizaram isso existiu, como sempre existe entre aqueles que imaginam e os que realizam, um fio invisível. De sonho. De mudança para melhor. Sim, o resultado pode ser um vilão. Mas os cientistas desse grupo explicam no artigo como se inspiraram na biologia dos pepinos do mar para criar essa substância que pode um dia fazer com que máquinas se montem sozinhas ou minúsculos robozinhos consigam levar um medicamento diretamente ao órgão onde ele é necessário, sem precisar afetar o corpo todo.
Escritores de ficção científica não necessariamente entendem de ciência; nem sempre têm ideia do que é ou não possível. Mas cientistas frequentemente se inspiram em visões inusitadas para resolver os problemas que estudam. O inesperado cria a mudança. Especialmente rico é um ambiente onde interagem transversalmente visões artísticas, culturas diferentes, educação científica e – importantíssimo – recursos. Isso precisa ser acompanhado por consciência social – aqueles que dominam uma tecnologia têm o dever de mostrar como ela funciona para que aqueles que se beneficiam dela entendam sua origem. Sem isso, parece apenas que foi feita uma mágica – ignorando todo o trabalho duro necessário para que ela acontecesse. Os sonhos, bem como as mudanças objetivas em que resultam, precisam ser compartilhados.
O estudo que citei é uma colaboração entre pesquisadores chineses e americanos. São países com governos perfeitos? Longe disso. Mas acertam precisamente ao apostar forte em pesquisa e educação – não é acaso. No Brasil, estamos nos permitindo sonhar, depois de um longo período de abafamento e desmonte das estruturas de pesquisa, de êxodo de mentes brilhantes. Temos uma janela para criar oportunidades. Solidificar institutos de pesquisa, aumentar bolsas – que são o salário dos estudantes, por um trabalho altamente especializado. Para que nossos jovens brilhantes possam soltar sua imaginação e, mesmo que viagem, tenham para onde voltar.