Nesta semana, um shopping de Porto Alegre liberou o estacionamento. Nos totens de pagamento, colocou uma faixa amarela com escritos em negrito: estacionamento gratuito. Mesmo assim, presenciei pessoas formando filas para pagar e olhando, paralisadas, para a máquina quando não conseguiam. Lendo o que estava escrito, mas continuando ali com o cartão na mão.
Observei aquilo por vários minutos, tentando entender essas pessoas que não conseguem mais ler, concluir e agir por si mesmas. Milhares – talvez milhões – de pessoas hoje pautam suas vidas repetindo automaticamente “orientações” recebidas por sua rede social favorita. A maneira como ensinamos nas escolas é ler, decorar e repetir. Ler, decorar, repetir. Enquanto a escola for assim, multiplicamos esse tipo de comportamento. E é possível levar pessoas, como gado, a se suicidar, ou a acreditar que algum messias mudará sua vida. Como um deus faria. Enquanto isso, ela olha fixamente para o totem, ou uma bandeira, ou um tanque de guerra.
Sim, para essas pessoas, a democracia é um problema. Elas precisam que lhes seja dito, repetidamente, o que fazer. As pessoas que, como gado, acreditam que podem invadir prédios públicos como aconteceu em Brasília, destruir patrimônio cultural, e que isso não tem consequências, que isso resolve seus problemas. Que não sabem quem foi Di Cavalcanti, porque eliminaram há muito o programa de arte na escola. Que desprezam arte, porque nunca viram alguém valorizar isso. Que acham que uma ditadura faria tudo ficar bem, sem entender que uma ditadura puniria o que fizeram com tortura e morte. Que cresceram ouvindo que pessoas diferentes delas são anormais e valem menos. A violência é sempre o recurso de alguém que não consegue mais pensar. E, obviamente, alguém emite essas mensagens que estimulam delírios, alguém paga seus custos, alguém abre – e abriu – portas. Alguém que sabe que é possível manipular pessoas para criar caos. E ganhar dinheiro com isso. Conhecimento é poder. Quem são essas pessoas?
A violência é sempre o recurso de alguém que não consegue mais pensar.
Eu gosto de escrever aqui contando como se faz ciência. A primeira coisa que aprendemos como cientistas é duvidar. A segunda é: os dados são soberanos. E isso mesmo que alguém diga ou escreva exatamente aquilo que você quer ver – ah, aquela tendência de confirmar o que você acha é forte! Se os dados não apoiam isso, provavelmente não é verdade. Se você lê que aumentou o número de mortes e internações de crianças com covid-19 e que elas precisam ser vacinadas. Tanto a pessoa que acredita piamente nisso como a que nega são vulneráveis. Mas por que acreditar na palavra de uma pessoa apenas ao proteger sua família? Por que ler apenas os primeiros artigos que aparecem na sua procura no Google? Por que não procurar outros especialistas? As únicas pessoas que odeiam perguntas são as que não querem pensar. A essas, frente à novidade e o inesperado – a essência da vida – resta oscilar entre paralisia e a fúria.