O Brasil está em processo de reconstrução. Parecemos um país saindo de uma guerra: nossas instituições públicas arrasadas como edifícios bombardeados. SUS, Ministério da Saúde, da Educação, universidades. As pessoas, ainda um pouco em choque, conversam com um misto de expectativa e alívio. Mas, de modo geral, vejo ao meu redor uma urgência de trabalho, uma preocupação de resgatar a capacidade que temos de funcionar como nação e cuidar não só dos nossos, mas de todos.
Nesse processo, algumas ausências são notáveis. A primeira é a dos responsáveis pelo atual governo – caracterizando extrema irresponsabilidade. Ainda temos seis semanas até o fim do mandato, contudo os ministérios funcionam praticamente em modo automático, graças aos funcionários técnicos. Assim saiu o Enem. Mas onde estão as vacinas atualizadas para as variantes do SARS-CoV-2? Onde estão as campanhas de vacinação de crianças? Quanto precisam crescer as internações hospitalares para que o ministro faça o seu trabalho? Não é hora de encerrar o expediente.
Da mesma forma, notei a ausência, até quarta-feira passada (16), de menções e nomes para o grupo de transição de ciência e tecnologia do governo eleito. Porque isso já anuncia uma definição de prioridades. Os acontecimentos dos últimos três anos deveriam ter provocado um reset na mente de líderes políticos – como o fez em grande parte da população. E, se hoje estamos aqui discutindo o futuro, devemos isso à ciência.
Na verdade, a pandemia ensinou que ciência não é algo alijado das demais áreas das nossas vidas, especialmente da economia. O certo, para líderes políticos que aprenderam algo com esse episódio mundial, seria incorporar cientistas em todas as áreas do seu governo – e não apenas em uma pasta. Como forjar uma economia pujante sem cientistas hoje? Como criar um setor agropecuário independente do clima sem cientistas? Sem falar em como prevenir catástrofes climáticas sem cientistas, impensável. Os gigantescos danos causados por informações falsas só podem ser revertidos com uma reforma educacional que inclua o pensamento científico no dia a dia de todos os níveis escolares – como brinca Neil DeGrasse Tyson, aulas de como identificar mentiras.
Não menos importante é a mais notável das ausências: nomes de minorias nas equipes de transição. Os dados – essa mania dos cientistas! – mostram que metade da população do Brasil é feminina; e mais da metade não é branca. Um governo que pensa em reconstruir o Brasil não deve pensar apenas em esquerda e direita – a representação vai muito além disso. A diversidade é a maior fonte de resiliência e renovação. Se é difícil encontrar nomes neste momento, aqui fica um recado para as equipes do governo recém eleito: não parem por aqui. Usem as redes sociais, usem os currículos Lattes e preencham rapidamente esses vazios se quiserem ser levados a sério pela maioria das pessoas.