Nesta semana, a Anvisa autorizou os primeiros testes clínicos de eficácia e segurança da vacina Spin-Tec para a covid-19. A vacina foi desenvolvida pelo grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) liderado por Ricardo Gazinelli, um dos grandes imunologistas brasileiros, no CTVacinas, em associação com a Fiocruz, que tem um braço em Belo Horizonte. Os testes clínicos serão coordenados pelo médico e imunologista Helton Santiago, que também trabalhou nos ensaios clínicos da vacina para a dengue produzida no Butantan.
A vacina usa uma tecnologia já conhecida há décadas, usada, por exemplo, na vacina da hepatite B, uma proteína recombinante (produzida por biologia molecular, sem precisar cultivar o vírus). A SpinTec é uma fusão entre pedaços da proteína S e da proteína N do Sars-Cov-2. Se alguns perguntam se vale a pena desenvolver agora uma vacina nova para a covid-19, Ricardo e Helton podem responder que a eficácia das vacinas disponíveis pode ser melhorada, com tecnologia segura.
O uso da proteína N na vacina é um diferencial das demais, baseadas na proteína S, apenas. Como a S sofre mais mutações, precisa ser atualizada, o que as empresas estão fazendo agora para as variantes novas. Na semana do dia 20 de setembro, comparando resultados com Ricardo e Helton no congresso da Sociedade Brasileira de Imunologia, comentávamos que seria muito interessante ver a eficácia da SpinTec em crianças, pois nosso estudo aqui, na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), mostrou que esse é o foco da resposta e da memória imune das crianças que tiveram covid-19. Talvez elas respondam melhor com essa vacina. Enfim, são várias perguntas sem resposta, para as quais podemos contribuir.
Mas devolvo outra pergunta: por que só agora chegamos aos testes clínicos? Por que empresas como Pfizer e AstraZeneca tiveram suas vacinas testadas e aprovadas pela Anvisa muito antes? (Estamos agora para analisar a aprovação da atualização da Pfizer para a Ômicron.) Depois dos pesquisadores de excelência, o fator que faz mais diferença em qualquer projeto é a quantidade de recursos investida. A UFMG sempre foi um centro de excelência no Brasil. Atraiu e formou grandes cientistas graças a um investimento inicial da Fundação Rockefeller para formar seu Departamento de Bioquímica, ancestral do de Imunologia, de onde saiu o INCT Vacinas.
Mas nada se compara à montanha de dinheiro investida pelas farmacêuticas nas vacinas de covid-19 que hoje dominam o mercado. Se quisermos liderança em qualquer área tecnológica, o tema de casa é mapear quem são seus melhores quadros, ouvi-los e investir. Muito. Essas pessoas foram formadas com recursos brasileiros e estão em universidades brasileiras. Cabe a nós fazer escolhas que nos ajudem a mantê-los aqui, trabalhando para resolver problemas brasileiros.