Erradicar: verbo transitivo direto e bitransitivo: arrancar pela raiz; extirpar.
Em 1952, em meio à Guerra Fria, o segundo maior medo dos norte-americanos, à parte o holocausto nuclear, era a poliomielite. Os sintomas pareciam gripais, mas alguns afetados desenvolviam meningite. Um em cada 200 sofriam paralisia e, desses, um em cada cinco morriam. Uma série de mortes e pacientes com pulmões paralisados levou pais de crianças a praticarem o isolamento social. Fecharam-se parques, piscinas, cinemas, escolas e igrejas. Motoristas evitavam descer dos carros receosos de inspirar o ar contaminado. Alguns culpavam imigrantes, outros sugeriam que as moscas carregavam a doença. No ano seguinte, Jonas Salk anunciava a vacina de vírus inativado, e em 1954 mais de 2 milhões de crianças participaram do estudo clínico que demonstrou a eficácia da vacina. Três anos mais tarde, a incidência de pólio havia caído 90% nos EUA.
Em 1962, a vacina de Albert Sabin (a gotinha), com o vírus atenuado, substituiu a de Salk por ser mais fácil de aplicar, e, em 1980, houve uma campanha massiva de vacinação contra a pólio no Brasil. Em 1982, o número de casos anuais no Brasil caiu de quase 3 mil para 62. Mas, com o surgimento do HIV, houve a volta da vacina Salk, já que vacinas atenuadas não deveriam ser aplicadas em pacientes imunossuprimidos. O ano de 1979 viu o último caso de pólio nos EUA, e em 1994 o hemisfério ocidental foi declarado livre de pólio.
Em 1996, Nelson Mandela lançou o programa “Chute a Pólio para Fora da África” em parceria com uma coalizão que incluiu o Rotary International. Nos anos 2000, a pólio permanecia apenas na Nigéria, no Paquistão e no Afeganistão. Países onde a guerra civil e a desinformação perseguiam e matavam profissionais da saúde em campanhas de vacinação. Nos últimos cinco anos, sobreviventes da doença, afetados por sequelas e paralisia, fizeram campanhas intensas na Nigéria. Chegando a enfrentar membros do Boko Haram, pediram aos pais que não deixassem de vacinar seus filhos – para esses não acabarem como eles. O apelo emocionado teve efeito: no dia 25 de agosto de 2020, a pólio foi declarada eliminada na Nigéria, tornando a África livre de poliomielite. Uma conquista histórica, que só pôde ser mantida com vacinação constante e extensa.
A interrupção da cobertura vacinal trará de volta a doença, que pode ser reintroduzida vinda dos dois últimos países que ainda registram casos anualmente. Essa é uma notícia boa, especialmente em um ano cujo maior desafio foi saúde pública. Nunca foi tão importante informar-se, entender e educar sobre vacinas. Nunca foi tão cruel, tão violento, espalhar mentiras e textos falsos sobre efeitos malignos da vacinação.
Os estudos sobre vacinas nunca terminam – pesquisamos continuamente sobre a segurança e a eficácia tanto das vacinas consagradas quanto das experimentais. Apenas vacinas podem erradicar doenças. E a melhor vacina para a ignorância com que tantos hoje ameaçam as nossas vidas é o conhecimento. Não deixe de se vacinar.