Muito se criticou, muito se comentou, muito se lamentou a esdrúxula e controvertida revitalização do Quadrilátero Central em Porto Alegre.
Até porque a lógica de revitalizar é devolver o vigor a algo, e a reforma mudou o sentido de tudo.
Na Rua dos Andradas, nosso cartão-postal de caminhadas pela capital, ocorreu a troca pavorosa das pedras antigas de basalto por blocos de concreto, sacrificando por completo as artérias do coração do centro.
Esperávamos renovação, veio uma perigosa substituição, sem consulta da população interessada, sem debate com os nossos historiadores.
Foi posto no local um piso neutro, desprovido de beleza, desprovido de vínculo com a nossa tradição, desprovido dos preceitos e traços açorianos. Não houve a conservação da superfície anterior.
Disposta a facilitar o deslocamento, a prefeitura optou por diminuir o brilho das vias. Nem parece mais um piso, mas uma cova.
A justificativa para esse modelo de reforma era a de priorizar a durabilidade, diminuindo assim os problemas de lenta reposição das lajes.
Só que a avenida Otávio Rocha, o primeiro trecho a receber intervenções em 2022, já começa a apresentar buracos, desníveis e comprometimento nas juntas.
Ou seja, a execução do plano sequer está concluída, com o encerramento previsto até o final de março de 2025, e parte do que foi feito se encontra em erosão, totalmente desgastada. O prazo inicial de 18 meses expirou, e ainda não temos segurança de sua qualidade.
As pessoas continuam tropeçando e caindo todos os dias, principalmente idosos e deficientes visuais, devido às interrupções súbitas na extensão do piso podotátil.
Em vez de garantir tranquilidade na mobilidade urbana, a incrementação do espaço apenas gera novos boletins médicos.
A tese da perenidade caiu por terra.
O comércio está desesperado. O canteiro de construção nunca termina, e jamais se chega a uma solução. Vem sendo uma tormenta manter as portas abertas no meio de tapumes infindáveis.
As obras apagaram o potencial turístico do local. Anularam a identidade da nossa nascente civilizacional, do berço do nosso município, num processo de cruel descaracterização. O que testemunhamos é uma colcha de retalhos, com diferentes texturas nas bordas do calçamento e em torno das tampas de bueiros.
Nunca um investimento dessa magnitude, na ordem de R$ 20 milhões, contou com uma vida tão curta e tão feia.
Nem economia teremos com o incessante retrabalho — retoques sucessivos num terreno que se mostra precocemente acabado —, nem longevidade alcançaremos com a precariedade do material, muito menos obteremos de volta aquele saudoso maravilhamento estético.
A nova Porto Alegre é absolutamente estranha: calçadões centenários desmemoriados e chafariz sem água.
Como atrair turistas se nem conseguimos conquistar a credibilidade e confiança dos próprios moradores?