Se algum colorado acreditava que Enner Valencia estava fazendo corpo mole no Inter, que forçava a sua saída do Beira-Rio, que não queria mais ficar e honrar o contrato até junho de 2026, as hipóteses caíram por terra com a apresentação do atleta no embate do Equador contra o Brasil pelas Eliminatórias, na sexta-feira (6).
Ele reproduziu o seu triste ocaso: falhas primárias de passes, dificuldade de dribles e chutes para fora. Foi uma extensão desleixada do Enner desmotivado e apático que vimos nas recentes exibições do Brasileirão.
No clube gaúcho, seu último gol ocorreu em 13 de julho, na desclassificação do Colorado para o Juventude, no Alfredo Jaconi, na terceira fase da Copa do Brasil. E isso que ele errou o primeiro pênalti, e teve a chance de repetir.
O que está acontecendo com o atacante ninguém sabe. São nove jogos e 59 dias sem pontuar. A camiseta 13 vem se consagrando como um número de azar.
Ele não desaprendeu a jogar nem se aproxima da aposentadoria aos 34 anos, porém experimenta um bloqueio criativo que não permite nenhum gol, ainda que se encontre livre e desimpedido na frente do goleiro. A realidade é que ele nunca foi o mesmo desde a derrota para o Fluminense em 2023, na semifinal da Libertadores, quando cometeu sacrilégios imperdoáveis de pontaria tanto em cabeçada quanto com seu canhão destro.
Talvez a explicação resida na própria carreira ciclotímica de Enner. Ele é de lua, de fases.
Sua abstinência não é nenhuma novidade. O centroavante equatoriano já passou 31 jogos e 300 dias sem balançar as redes com a camisa do Tigres, do México, entre 2019 e 2020. Ou seja, o desespero atual não é nem um terço do que ele já viveu.
Em sua trajetória, há várias greves de comemoração maiores do que no Inter: 11 jogos sem marcar no Emelec (2012), 23 jogos sem marcar no mesmo Emelec na temporada seguinte (2013), 10 jogos sem marcar no West Ham (2014/2015), 20 jogos sem marcar no mesmo West Ham na temporada seguinte (2016), 11 jogos sem marcar no Everton (2016/2017).
É uma constância desaparecer de repente, apequenar-se, sucumbir à zaga adversária e amargar uma seca de dezenas de rodadas.
Mostra-se um artilheiro que depende totalmente da confiança. Precisa se sentir amado mais do que cobrado. Nesse sentido, as vaias jamais o ajudarão a se reerguer. Ele tem consciência das suas dívidas morais, mas seu psicológico é suscetível às frustrações das derrotas e eliminações do ano.
Quanto mais tenta, mais se vê incapaz de sair da zica.
Devemos encorajá-lo, resgatá-lo do fundo do poço, firmar sua adaptação. Não dá para deixá-lo ilhado em seu trauma.
Ele chegou ao Inter voando, após seu melhor desempenho pelo time turco Fenerbahçe. Acumulou 33 gols em 48 jogos, numa média de 0,68 por partida, além de sete assistências. Terminou o calendário europeu como o quarto principal goleador do continente, atrás apenas de Haaland, Mbappé e Kyogo Furuhashi.
Não podemos ignorar seus momentos bons. Afinal, não fez 178 gols à toa, muito menos se transformou no maior artilheiro da seleção do Equador com 41 gols por acaso.
Com duas Copas do Mundo nas costas, Enner só irá ressurgir e aliviar o peso do coração com o apoio da torcida. A torcida cura.