Começávamos uma longa jornada de gravações pelo interior do Rio Grande do Sul. A realização de um sonho profissional, a oportunidade de estar perto das pessoas e contar suas histórias, o que mais amo fazer. Mas eu estava angustiada. Não sei se com o tamanho do desafio e a vontade de fazer dar certo ou com a saudade do Martin. Longos períodos assim afastada do meu filho, de sete anos, sempre geram uma certa apreensão.
Passei a noite acordando, com a TV ligada. E mesmo que só fôssemos sair para gravar às 10h, acompanhei o nascer do sol. Às 7h, estava absolutamente desperta. Fiz uma chamada de vídeo com o pequeno que estava indo para a escola, e segui, ali, naquela angústia que não passava.
Depois de dias de chuva, o sol aparecia no céu da cidade de Farroupilha, na Serra. Na mala, entre equipamentos e figurinos, tinha tênis e roupa de ginástica.
Não havia vontade real de sair, mas me vesti, coloquei um podcast no fone de ouvido e fui caminhar, intercalando alguns pequenos trechos de corrida. Deparei com um parque: um lago no meio refletia o sol, e conforme eu ia percorrendo aquele espaço, meu ânimo ia mudando. O corpo em movimento, o suor, o ventinho e o papo animado tocando no som foram me transformando. A cada passo o movimento de corrida foi ficando mais natural e tranquilo. Eu quase conseguia sentir as coisas ruins indo embora, ficando pelo caminho.
Grandes corredores, maratonistas ou ultramaratonistas relatam que entram em uma espécie de transe nas provas — no extremo esforço, as dores são aplacadas através da conexão com a mente. Amigos, conhecidos e corredores amadores sempre me contam que usam o momento da corrida para "colocar as ideias no lugar". Nunca tinha entendido. Até aquele dia.
Voltei para o hotel. Tomei um banho. E saí para trabalhar sendo uma pessoa completamente diferente daquela que tinha acordado. Muito mais leve. Tenho certeza que foi o efeito do exercício físico, que, pela primeira vez em meus 37 anos, não veio acompanhado de sofrimento.
A corridinha descompromissada em meio ao trabalho na Serra foi resultado de uma decisão tomada na primeira consulta com o oncologista depois do fim da parte mais intensa do meu tratamento para o câncer de mama. E reforçada em outubro do ano passado, na primeira edição da série Caminhos para a Vitória, do Globo Esporte, de que o exercício físico precisa fazer parte da minha vida.
Saí pra correr naquele dia. Improvisei um treino dentro do quarto quando choveu. Usei a salinha de ginástica de outro hotel pra me mexer. E a cada "sim" para o exercício me sentia mais preparada. A musculatura tem que estar forte para a corrida não ser sacrifício. A corrida ajuda a ganhar resistência para outras tantas atividades.
Nessa semana me matriculei em uma aula de dança. Na rotina de cuidar de casa, trabalhar, dar conta dos meus afazeres e de um filho pequeno, às vezes, fica bem difícil acreditar que cabe um tempinho para o exercício. Mas aprendi que precisa caber. É a nossa saúde. Física e também mental.
Com este pensamento começo a segunda temporada de Caminhos para a Vitória, que estreou essa semana no Globo Esporte, na RBS TV. Será uma jornada mais longa e completa, de seis meses com esse espírito. Esse novo Caminhos tem a proposta de nos preparar para a cobertura da Copa do Mundo no Catar. Será mais uma experiência desafiadora, longe do filho, com as angústias ali prontinhas pra tomar conta. Mas já aprendi: vou levar um tênis de corrida na mala, ele pode salvar o dia.