A medida provisória (MP) editada pelo governo em janeiro deste ano deve tornar o acesso à aposentadoria no campo mais difícil, na avaliação de especialistas. O texto prevê a criação de um cadastro dos segurados especiais pelo Ministério da Economia, a ser utilizado pelo INSS para a concessão dos benefícios rurais a partir de 1° de janeiro de 2020.
Dessa forma, não seria mais aceita a declaração de tempo rural fornecida pelos sindicatos e homologada pelo INSS como meio de prova.
— Pelo texto, não está claro quais órgãos públicos poderão homologar a autodeclaração que comprove a atividade. Alguns pontos dependerão de regulamentação para serem colocados em prática — analisa Jones Treter, advogado especialista em Direito Previdenciário.
Sobre a necessidade de contribuição mínima, o especialista lembra que o benefício voltado ao segurado especial da Previdência, no caso os trabalhadores rurais, sempre teve um caráter assistencial – o que justificaria a cobrança apenas pela comercialização efetiva.
— É uma forma de incentivar as famílias a permanecerem no campo, levando em conta as peculiaridades da atividade agrícola — explica Treter.
Se as novas regras forem aprovadas no Congresso sem alterações, o receio é de que o êxodo rural aumente ainda mais nos próximos anos. Isso sem contar o impacto nas economias locais, acrescenta Aristides Santos, presidente da Contag, que está elaborando sugestão de emendas para entregar à bancada ruralista.
— Em mais de 70% dos municípios brasileiros, o dinheiro do benefício dos aposentados rurais é maior do que a transferência do fundo municipal. A Previdência é que sustenta essas famílias no campo.
Baixo faturamento e contribuição maior
Produtor de soja em Passo Fundo, no norte do Estado, Rui Lorenzato fatura em torno de R$ 28 mil anualmente com a venda da soja colhida em 10 hectares. Se a exigência da contribuição mínima de R$ 600 for aprovada pelo Congresso, a contribuição da propriedade será de 2,1% da produção – superior ao 1,3% descontado atualmente.
— Pelo o que estamos vendo, essa reforma analisa friamente o econômico, mas não leva em conta aspectos da produção de alimentos — lamenta Lorenzato, 55 anos, que começou a trabalhar no campo ainda criança.
A produção de soja representa a principal renda do agricultor, que tem também cinco vacas de leite e criação de peixes em açude. Na propriedade de 14 hectares, no distrito de Bom Recreio, ele e a mulher Eva Valéria Lorenzato, 48 anos, se dividem em todas as atividades. Não têm funcionários.
— E nossos filhos já estão trilhando outros caminhos, na Engenharia Civil e no Direito. Vão acabar se desvinculando da agricultura — conta.