Os benefícios da inteligência artificial (IA) não se restringem à área de tecnologia. Empresas de outros setores têm adotado estratégias para utilizar a ferramenta como auxiliar nos negócios.
Para especialistas, essa interação é vantajosa ao meio ambiente, estimula responsabilidade social e qualifica a gerência de negócios, três das bases de práticas ESG – sigla em inglês para "ambiental, social e governança".
Segundo a Pesquisa Panorama 2024, da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham), a IA lidera as tendências com potencial para acelerar os negócios em 2024. A segunda posição é ocupada pelo ESG.
O levantamento indica que 68% das empresas já utilizam a IA para automatizar tarefas, reduzir custos operacionais e dar suporte à tomada de decisões.
Os resultados foram obtidos com respostas de 694 executivos brasileiros sobre as principais tendências capazes de impulsionar negócios e o quão prontas as empresas estão para incorporá-las.
Tecnologia na prática
No caso da Lojas Renner, o trabalho com IA foi intensificado em 2020, com a criação de uma diretoria de dados. O setor tem profissionais dedicados à implementação de motores capazes de contribuir para a tomada de decisões das equipes.
A tecnologia é usada para monitorar interesses dos consumidores – modelagens, tecidos e cores estão entre os focos. Essas informações são compiladas para que o desenvolvimento das coleções seja mais ágil e acertado.
— Produzimos o que o cliente quer, reduzindo remarcações e quebras de estoque, evitando produzir mais para alcançar metas. Ao testar peças em quantidades menores, podemos dimensionar melhor os pedidos feitos aos nossos fornecedores. Assim diminuímos o estoque e evitamos a produção excessiva, o que reduz o desperdício e minimiza o impacto ambiental — diz Leila Martins, diretora de Dados da Lojas Renner.
O centro de distribuição da empresa em Cabreúva (SP) é um exemplo da aplicação de inteligência artificial, com o uso de robôs para fazer o armazenamento de produtos. Os dispositivos são treinados por meio da IA.
— Eles aprendem sobre os produtos mais pedidos e organizam o estoque de forma autônoma, ganhando mais eficiência. É uma tecnologia inovadora que aumenta nossa produtividade, com benefícios concretos para o consumidor final. Indiretamente, potencializa a nossa atuação ESG — explica Leila.
Atenção à natureza
Vanessa Pinsky, especialista em sustentabilidade e conselheira do movimento Capitalismo Consciente Brasil, afirma que a inteligência artificial é uma ferramenta capaz de estimular boas práticas ambientais e fomentar a economia ao mesmo tempo.
A IA pode acelerar a transição da economia linear para um sistema circular e regenerativo
VANESSA PINSKY
Especialista em sustentabilidade e conselheira do movimento Capitalismo Consciente Brasil
Ela cita uma pesquisa feita pela Microsoft e PwC que aponta a contribuição da tecnologia na geração de US$ 15,7 trilhões (R$ 86 trilhões) para a economia global até 2030. Além da produtividade, existe um cálculo para ajudar na redução de 4% nas emissões de gases de efeito estufa até o fim da década e criar 38,2 milhões de novos empregos.
— A redução de emissões com a otimização de rotas no transporte de cargas e logística, a detecção preditiva em tempo real de problemas nos veículos e condutores, que podem levar ao aumento do consumo de combustíveis, são exemplos do potencial de contribuição da IA na descarbonização do setor — exemplifica.
Agronegócio e produção de energia renovável são outros setores que se beneficiam da tecnologia, na avaliação dela. A IA também tende a ser uma aliada na prevenção e enfrentamento de crises ambientais e climáticas.
— A IA pode acelerar a transição da economia linear para um sistema circular e regenerativo, viabilizando processos de aprendizado mais ágeis na prototipagem dos produtos, no ecodesign e na gestão de resíduos. Com as novas regulações ESG e barreiras não-tarifárias, a garantia de produtos livres de desmatamento, monitoramento dos direitos humanos e transparência na cadeia de valor são tendências em negócios sustentáveis — acrescenta.
Ela (IA) permite liberar tempo das equipes para atuar em funções mais criativas e com maior valor agregado
SANDRO RIGO
Professor dos cursos de Ciência da Computação e Sistemas de Informação da Unisinos
Prevenção contra fraudes e falhas operacionais
Outro benefício social é atuar contra a ocorrência de fraudes, segundo Sandro Rigo, professor dos cursos de Ciência da Computação e Sistemas de Informação da Unisinos. Isso pode ser feito por meio do uso de algoritmos de aprendizado de máquina que permitem analisar grandes volumes de dados financeiros e de transações em busca de atividades irregulares.
Abordagens de IA para Processamento de Linguagem Natural (PNL) podem identificar áreas em risco de não conformidade às regulamentações. Já os modelos preditivos disponíveis na IA ajudam a prever falhas operacionais, como interrupções na cadeia de suprimentos ou falhas em motores.
— Embora pareça uma contradição, a IA pode atuar como um potencializador de melhorias no aspecto social, tendo em vista que suas técnicas podem ser adotadas nas instituições de modo a automatizar tarefas perigosas ou repetitivas. Ela permite liberar tempo das equipes para atuar em funções mais criativas e com maior valor agregado — diz o professor da Unisinos.
Contratações e reputação
O tamanho da empresa não é uma barreira: todos os negócios podem usar recursos de IA para apoiar práticas de ESG na governança, conforme o especialista. Mostra—se como potencial auxiliar em processos de contratação, na melhora da reputação institucional e atração de investidores e clientes que valorizam a sustentabilidade:
— A IA pode ajudar na responsabilidade social ao melhorar as condições de trabalho com o acompanhamento detalhado de necessidades das equipes, aumentar a segurança e promover a diversidade e inclusão. Pode ser empregada para analisar perfis e reduzir vieses em decisões de recrutamento e promoção, garantindo práticas mais justas e equitativas dentro das empresas — pontua Rigo.