Um dos fatores que explicam a forte chuva que atingiu o estado, principalmente nas regiões Centro e Norte, desde setembro, é o El Niño. O ápice do fenômeno, no entanto, será o mês de dezembro, segundo os meteorologistas, que alertam para novas possibilidades de temporal e danos decorrentes nas próximas semanas. Somente nos primeiros 20 dias de novembro, alguns municípios do norte do RS registraram um acumulado de chuva muito acima do esperado para o mês que fica entre 100mm e 150mm, segundo a Climatempo.
— Estávamos preparados para essa situação extrema no RS. Em outros anos, tivemos chuva acima da média, mas em 2023 foi atípico, com volumes significativos em setembro, outubro e novembro. Neste mês, as faixas Central e Sudoeste do estado tiveram 200mm, na faixa Centro-Norte, acumulados superaram os 300mm e, na faixa extremo Norte, passou dos 400mm em algumas cidades, como Passo Fundo, Cruz Alta e Vacaria, por exemplo — explicou o meteorologista da Climatempo, Guilherme Borges.
Formado no segundo semestre do ano, o El Niño se caracteriza pelo aumento de temperaturas no Oceano Pacífico, causando transformações na circulação atmosférica na América do Sul e resultando em chuvas volumosas no sul do país. O especialista destaca, ainda, outra manifestação comum do fenômeno que deverá estar presente em dezembro em terras gaúchas.
— As temperaturas ficarão acima do normal. O fato, inclusive acontecerá em todo o Brasil — lembrou.
Antes do último mês do ano chegar, Borges alerta para a projeção de chuva significativa nesta semana que poderá afetar as bacias dos rios Caí e Taquari, já em suas cotas de inundação atingidas.
— Nos preocupa os níveis em seis pontos próximos a Porto Alegre: Estrela, Bom Retiro do Sul, Porto Mariante, Taquari (Rio Taquari), Barca do Caí e Passo Montenegro (Rio Caí). A instabilidade formada no Paraguai se direcionará para o Rio Grande do Sul. As frentes frias também ajudam na intensificação da chuva.
O especialista acredita que há chance de chuva acima de 200mm nos próximos dias, principalmente na faixa oeste e centro do Estado. Já pontos isolados no norte gaúcho deverão registrar até 300mm.
— Isso é muito além da média que estamos acostumados a ver. Entre janeiro e fevereiro do ano que vem, deveremos ter um alívio dessas chuvas, que estarão entre a média e ou um pouco mais, ainda que o El Niño atue até abril de 2024. Mas o perigo de deslizamentos existe porque o solo está muito saturado devido às ocorrências deste semestre. Depois disso, chuvas volumosas, somente a partir de março, porque atmosfera estará muito aquecida, trazendo novos episódios intensificados — projeta Borges.
Atenção à distribuição da chuva
Professora da Faculdade de Meteorologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e integrante do Laboratório de Climatologia Aplicada, Eliana Klering não acredita em um cenário de dezembro semelhante a setembro, quando mais de 50 pessoas morreram no Vale do Taquari em decorrência das enchentes. Mas, corrobora sobre a intensidade maior do que o costume para o mês.
— Deverá chover, em dezembro, em torno de 30% a 40% acima da média. O problema é a distribuição temporal dessa chuva. Poderá acontecer em um ou dois dias ou ao longo de todo o mês. A sobrecarga no sistema de drenagem, como vimos no Vale do Taquari, é que ocasiona os desdobramentos de inundações, transtornos e perdas de vidas.
Conforme Eliana, as áreas de maior impacto pelas chuvas de dezembro no RS são as regiões Noroeste e parte da Fronteira Oeste, na divisa entre Brasil, Uruguai e Argentina. Aliadas às pancadas de chuva, as altas temperaturas no Estado deverão alcançar os 40º C, segundo a professora.
— Essa combinação pode gerar grandes volumes de chuva em curtos períodos de tempo — reitera a meteorologista da UFPel.
Sobre a possibilidade de um verão mais quente que a primavera, meteorologista Josélia Pegorim, da Climatempo, relativiza
— É durante o verão, entre 22 de dezembro e 20 de março, que o Hemisfério Sul recebe a sua maior carga de sol. Independente do El Niño, é no verão que a atmosfera do Brasil está mais quente e isso facilita a formação de nuvens carregadas que provocam as pancadas de chuva. Mas este verão não será normal, justamente por causa do fenômeno. Não será mais quente do que a foi a primavera, mais será uma estação realmente de calor — diz a meteorologista.