A 1ª Delegacia de Polícia Regional, em Montenegro, no Vale do Caí, ganhará nova sede no final de abril, em prédio que havia abrigado unidade do Instituto de Previdência do Estado. A reforma para adaptar as instalações, ao custo de R$ 500 mil, ocorreu com doações da comunidade e foi integralmente realizada com mão de obra de apenados.
Foram feitos reparos na alvenaria e edificação de novas divisórias no interior do prédio, transformando um ambiente que era destinado para atenção à saúde em um local apropriado para atendimento a mulheres vítimas de violência, ocorrências e atividades administrativas. Além da renovação da fachada e da construção de rampa para acessibilidade, o projeto desenvolveu a primeira instalação para prática de tiro na região.
A DP está localizada na Rua José Luiz, 1.755, no Centro, e substituirá prédio alugado pelo Estado. Participaram do financiamento da obra setores do Poder Judiciário e do Ministério Público, prefeituras de municípios vinculados ao atendimento da Delegacia Regional, empresas e moradores da cidade e do Vale do Caí.
— Tornou-se um espaço muito funcional e de melhor qualidade para o trabalho e para o atendimento à população. Sistemas elétrico e hidráulico novos. Ambientes revitalizados. Novas instalações. Uma linha de tiro como nenhuma outra na região, onde policiais poderão praticar com segurança — descreve o delegado Regional, Marcelo Pereira.
O delegado conta que as obras tiveram início em julho de 2022. Os recursos foram sendo captados por etapas com empresas e membros da comunidade local. O trabalho, realizado por homens condenados pela Justiça a cumprir penas por crimes. Pereira diz que o desafio de conciliar tais elementos é entendido como recompensador.
— É a essência da ressocialização — aponta.
Pereira destaca que passaram pela obra quase uma dezena de apenados, parte deles provenientes do regime semiaberto e alguns do fechado. Nenhum incidente de insegurança incorreu durante o período.
— Acredito que o preso entende esta oportunidade. Alguns dos homens que passaram pela reforma puderam aprender um ofício que vai ajudar no momento de reintegração à sociedade — avalia o delegado.
Ruptura de estigma
Para a juíza Roberta Penz de Oliveira, titular da Vara Regional de Execução Criminal de Novo Hamburgo, o trabalho é extremamente importante para estimular sentidos de responsabilidade, participação comunitária e contribui para o rompimento do estigma sobre o envolvimento passado com ilícitos.
— Do ponto de vista da pessoa em cumprimento de pena são inúmeros os benefícios. Do ponto de vista da sociedade, a gente também verifica uma importância muito grande, uma vez que a comunidade vai ganhar uma delegacia, uma estrutura pública para seu atendimento. É extremamente importante, pois além de tratar (da ressocialização), a gente ajuda a sociedade de alguma maneira — analisa a magistrada.
Para poder trabalhar, apenado passa por seleção
A atividade com permissão para um apenado trabalhar, no jargão técnico da administração penitenciária, é chamada de "liga laboral", explica o diretor da Penitenciária Modulada Estadual de Montenegro, Vinícius Cadena de Assumpção. Para acessarem a liga, segundo o policial penal, os condenados passam por avaliação psicossocial e análise técnica sobre riscos de segurança.
— A preferência é por presos que não tenham uma longa pena a cumprir. Por um perfil que esteja engajado na mudança de comportamento e enxergue o trabalho externo como uma oportunidade de mudança de vida — comenta.
Cadena sustenta que apenados ligados a facções dificilmente são admitidos. Há reservas sobre determinados tipos penais implicados no cumprimento de pena. Crimes contra a vida e delitos patrimoniais praticados com emprego de violência são um histórico indesejado para os recrutadores.
— Quando o preso entra numa atividade externa, pode acreditar que o muro da prisão está diminuindo. Não podemos permitir que a oportunidade se transforme em um problema para a segurança pública — define.
Cadena cita o exemplo que um homem de 58 anos, condenado a 17 anos de reclusão, que havia cumprido sete anos de sua pena, e, restando uma década de cadeia, entendeu a "liga" como uma chance de restaurar a vida em liberdade.
— Três dias na liga representam um dia a menos na cadeia — conclui.