Em janeiro deste ano, o Rio Grande do Sul registrou 5.289 ocorrências de estelionato. Embora a média ainda seja de 170 por dia, a redução é expressiva: 29,6% em comparação com o mesmo período do ano passado. É o menor número de golpes comunicados à polícia desde que os casos começaram a subir, em abril de 2020. Os dados integram os indicadores de criminalidade da Secretaria da Segurança Pública (SSP) do RS.
Os estelionatos começaram a apresentar alta durante as medidas de restrição para conter a pandemia do coronavírus, quando aumentaram as transações online. Os golpistas encontraram no ambiente digital terreno fértil para propagar esse tipo de crime, e obter lucro rápido. Em abril de 2020, foram 4.301 registros. Desde então, os indicadores nessa área saltaram e alcançaram o pico em março de 2022, com 8.762 registros.
— Hoje em dia muitos dos golpes se dão pelo meio digital, praticamente todos. Isso demanda uma investigação tecnológica muito grande, que leva um tempo. Na maioria das vezes precisa de autorizações judiciais para a quebra de sigilos, de dados, etc. Isso leva um tempo — avalia o Chefe da Polícia Civil no Estado, delegado Fernando Sodré.
Ao longo desse período, foram tomadas diversas medidas na tentativa de frear esses números no Estado. Em janeiro, o número de golpes caiu no RS. Na Capital, a queda foi mais expressiva, de 40%, passando de 1.428 em janeiro de 2023 para 845 no primeiro mês deste ano. Porto Alegre ainda é a cidade com maior número de registros, seguida por Caxias do Sul, Canoas, Santa Maria, Gravataí, Pelotas, Novo Hamburgo, Alvorada, Passo Fundo e São Leopoldo.
Uma das estratégias apontada como essencial é o combate aos grupos criminosos por trás dos golpes. São bandos que se especializam em alguns tipos de trapaças, como golpe dos nudes e da falsa central telefônica, que são cometidas em série, alcançando reiterado número de vítimas.
— Com esse trabalho, conseguimos atacar vários desses grupos que praticavam golpes. O crime nessa área não tem divisa. Fizemos buscas inclusive no Nordeste. Isso acabou enfraquecendo alguns desses grupos e eles acabaram diminuindo a atuação no Rio Grande do Sul. Não quer dizer que o número é baixo. Não é. Mas já conseguimos colocar uma boa curva de inflexão disso, que estava crescendo — afirma Sodré.
Algumas dessas prisões ocorreram em estados como Santa Catarina, São Paulo e Paraná. No ano passado, foi desencadeada operação contra um grupo especializado no golpe dos nudes, que costumava atacar médicos, empresários e políticos de fora do Estado. Foram identificadas 80 vítimas em Santa Catarina, Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Amazonas, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Paraná, Mato Grosso e no RS. Um dos alvos teria perdido mais de R$ 100 mil.
Prevenção
Outra estratégia apontada como essencial para esta redução dos golpes é a prevenção, com a divulgação de informações sobre os casos mais comuns. Alguns cuidados simples podem ajudar a evitar esse tipo de delito, como não acreditar em vantagens oferecidas. Essa é uma das principais formas de os golpistas tentarem fisgar as vítimas, independentemente do tipo de trapaça. Algumas ações foram adotadas ao longo dos últimos anos, como a divulgação de cartilhas informativas sobre os golpes mais comuns.
— É importante para as pessoas não caírem mais nesse tipo de golpe. Como se diz “não existe almoço grátis”. Esse tipo de orientação para diminuir a vulnerabilidade das pessoas e acreditar nisso tem sido feito um trabalho importante. Creio que isso também está começando a conscientizar as pessoas e ajudar na diminuição da incidência desses crimes — diz o delegado.
Família perde R$ 50 mil ao tentar comprar casa na Região Metropolitana
Quando tentava comprar uma casa em Canoas, na Região Metropolitana, uma família foi vítima de um golpe na semana passada, e perdeu R$ 50 mil. O valor foi usado para adquirir a moradia no bairro Niterói. Depois de negociarem com uma mulher, assinarem o contrato de compra e venda e fazerem o pagamento, passaram a ser ameaçados.
— Um homem chamou meu pai e minha prima dizendo que aquele terreno era dele, que não era pra eles entrar lá. Disse que estava na cadeia, fez ameaças de morte — relata o filho de uma das vítimas, que preferiu não ser identificado.
A família residia em outra cidade da Grande Porto Alegre e decidiu se mudar para Canoas. Pela internet, encontraram o anúncio da venda da casa, por R$ 50 mil. Antes de fecharem a compra chegaram a visitar o local.
— O valor estava muito baixo para a área. Isso até me fez suspeitar. Mas eles estavam muito empolgados com a ideia de vir morar aqui perto da gente. Como são pessoas que não passam a perna nos outros, não tem maldade, não desconfiaram — diz o filho.
Com a compra acertada, a família vendeu a casa onde vivia e repassou o dinheiro para a suposta proprietária do imóvel. Cerca de duas horas depois, começaram a receber as ameaças. A mulher que havia vendido a casa não atendia mais as tentativas de contato. Foi quando eles entenderam que se tratava de um golpe. O caso foi registrado na Polícia Civil.
— Quando fui pesquisar na internet, vi que já havia reportagem alertando sobre isso, e que era mesmo um golpe. É um sentimento muito ruim. Venderam a casa deles, tiveram que sair. E agora estão morando de aluguel — conta o filho.
O golpe
Em dezembro, GZH mostrou que essa modalidade do golpe da casa própria já vinha fazendo vítimas no Estado. Pela internet um morador da Região Metropolitana encontrou um anúncio de uma casa em Esteio, no mês de julho. A moradia, no bairro Parque Amador, era vendida por R$ 85 mil. Após o contato, chegou a ir até o imóvel para uma visita e, depois de fechar a negociação, depositou o valor. Por fim, descobriu que tudo fazia parte de uma farsa e passou a ser ameaçado.
O esquema arquitetado pelos estelionatários, segundo a Polícia Civil, vai muito além de publicar anúncio falso. Antes de chegar nesta etapa, os golpistas escolhem uma residência abandonada, que é "maquiada" para servir de isca para as vítimas. Após a negociação e pagamento, entram na fase da ameaça, na qual intimidam as vítimas para que não acessem a moradia.
Na última sexta-feira (23), a Polícia Civil desencadeou a Operação Domus, em Canoas, onde prendeu um grupo criminoso que estava aplicando esse tipo de golpe da casa própria. Quatro suspeitos foram presos, sendo três com prisão temporária e um com preventiva. O grupo é investigado por extorsão, estelionato, falsificação de documento público e associação criminosa. A polícia não confirmou se o grupo é o mesmo que enganou o morador na semana passada.
Dicas para se proteger
Do golpe da casa própria
- Desconfie de valores abaixo do mercado, que podem ser formas de atrair vítimas.
- Analise a documentação do imóvel antes de concretizar a compra.
- Certifique-se de que não há restrições de venda do imóvel, como dívidas, penhoras e disputas judiciais.
- Busque conversar com vizinhos no entorno da moradia.
- Não faça nenhum pagamento antes de se certificar que está tudo regularizado com o imóvel e com a compra.
De outros golpes
- Não acredite em lucro fácil ou vantagens que pareçam muito atrativas. Essa é a principal estratégia dos golpistas para atrair vítimas
- Não acredite em desconhecidos que lhe abordam na rua ou por telefone. Não acesse links na internet dos quais não tem segurança. Desconfie
- Converse com familiares, amigos ou mesmo gerente de banco se tiver desconfiança. Estelionatários tentam criar meios de impedir que a vítima busque orientação, como mantê-la ao telefone, para que não seja alertada
- Tome cuidado ao imprimir segunda via de boleto em sites e ao fazer compras online. Golpistas podem criar sites falsos para enganar os clientes
- Quando fizer uma compra online, guarde num arquivo no computador o link da compra. Pode ser útil para a investigação, em caso de golpe
- Não faça depósitos bancários e nem recargas de celulares para quem não conhece.
- No caso dos leilões, verifique se os leiloeiros estão cadastrados junto ao Judiciário. As contas para depósito em leilões oficiais não são de pessoa física ou jurídica e, sim, judicial
- No WhatsApp, habilite a verificação em duas etapas e não forneça esse tipo de código por telefone. O mesmo cuidado vale para outros aplicativos – de compras a bancos – que tenham o recurso de verificação em duas etapas
- Em aluguéis ou compra de imóveis, desconfie de preços abaixo do mercado.
- Se for alugar um imóvel, desconfie se o dono exigir adiantamento e tiver pressa para que o depósito seja feito ou mesmo se o proprietário não aceitar atender a ligações ou se recusar a receber visita do locatário, para conferir a casa
- Se receber contato por telefonema ou mensagem de familiar pedindo ajuda, certifique-se de que é real. Telefone para a pessoa antes de qualquer transferência. Converse com outros parentes antes de fazer qualquer depósito
- Se estiver vendendo algo, não entregue o bem antes de ter certeza de que recebeu o valor do pagamento. Depósitos só são confirmados pelo banco após a conferência do envelope. Então, aguarde para enviar a mercadoria
- Se for vítima, registre o caso em uma delegacia da Polícia Civil ou pela Delegacia Online. Tente repassar aos policiais o máximo de informações sobre os golpistas
Fonte: Polícia Civil-RS